Ênfase no social ou no nacional?
Encontramo-nos desde antes do passado 20 de dezembro no meio de uma longa corrida eleitoral que terá a sua seguinte etapa na repetição das eleições às cortes gerais do Estado a celebrar este 26 de junho e que, inicialmente supõe-se, rematará no outono com a celebração das eleições autonômicas.
Acontece a vezes que à hora de defrontar por parte do nacionalismo popular representado pelo BNG o repto eleitoral, que essencialmente consiste em angariar o maior número de votos, emerge no seio do nacionalismo um velho dilema consistente em determinar onde fazer mais empenho à hora de emitir a nossa mensagem, se na questão social ou na nacional.
Do meu ponto de vista este aparente dilema resolve-se adequadamente de termos em conta a inserção da Galiza no seio do Estado Espanhol, como nação colonizada. A função colonial que cumpre a nossa nação explica e determina a situação econômica, social, política, cultural, ambiental e mesmo ajuda a compreender o comportamento sociológico e político da povoação galega.
De aceitarmos que o nacionalismo e os movimentos de libertação nacional pelo mero feito de pôr em causa o status quo estabelecido já está atacando um dos alicerces da estrutura hierárquica do imperialismo estaremos pondo as bases para resolver esta presumível controvérsia.
A ideologia dominante somente reconhece às nações dotadas de Estado próprio e nega-lhe a existência a todas aquelas que carecemos deste instrumento de defesa. Como máxima concessão chega a aceitar o reconhecimento de partes do Estado com peculiaridades próprias, mas sempre fazendo parte do mesmo, como acontece com as nações integradas no Reino Unido ou com o Québec no Canadá, mas em todo caso subordinadas ao Estado central. Caso aparte é o que se deu, por exemplo, na Bolívia com as distintas nações andinas quando o governo popular de Evo Morales passou a reconhecê-las explicitamente, e mesmo adenominar o páis como Estado Plurinacional de Bolívia, no que se reconhecem 37 idiomas oficiais.
A luta antiimperialista adota formas patrióticas nas nações com Estado próprio agredidas pelo imperialismo. Forças políticas destas nações defendem políticas patrióticas e de classe perante dos desenhos imperiais que as condenam à dependência e mesmo à falência. Precisamente em Portugal o PCP tem desenvolvido ultimamente uma campanha com o slogan de “por uma política patriótica e de esquerda”, do que se pode deduzir que hoje por hoje as lutas que unem a defesa dos interesses nacionais e de classe são as que estão a pôr em questão o sistema imperial dominante.
O devir histórico da Galiza ajuda a entender a estrutura de classes e o papel que cada uma delas cumpre na nossa formação social. Assim podemos afirmar, sem medo a nos equivocar, que a burguesia galega tem renunciado a cumprir o seu papel como burguesia nacional, a diferença do que acontece com setores das burguesias de Esuzkadi ou Catalunya, mas sim tem aceitado submissamente exercer como burguesia intermediaria e, nalguns casos, integrada na elite que controla o aparato do Estado Espanhol. O papel assumido pela burguesia galega define-o perfeitamente Anton Vilar Ponte em 1918 na seguinte cita: “La Voz de Galícia é o exemplo perfeito de mimetismo madrilenho e espelho no que burguesia corunhesa vivendo em Madrid, olha o seu retrato de colonizada”.
Ao não contar a Galiza com uma burguesia com vontade de exercer como classe desde uma óptica nacional, e pelo tanto nacionalista, é o que explica o porquê todos os intentos levados a cabo, por pequenas frações da mesma, para se dotar de uma expressão política própria foram sempre um fracasso.
Razão pelo que a defesa da reivindicação nacional, mormente, teve de ser assumido pelas camadas populares. Camadas populares constituídas pelos setores operários, da agricultura e da pesca, assim como por trabalhadores e trabalhadoras por conta própria, profissionais e setores da pequena burguesia. É por tanto a união das capas populares a melhor formula para defender a nação e os sues interesses.
São plenamente consciente de esta discrição precisar de um estudo mais profundo, rigoroso e atualizado. Porque, por exemplo, no que se refere ao setor agrário este tem sofrido uma grande transformação nos últimos 20-30 anos baixo a forma de uma redução brutal. Transformações que têm favorecido a emergência de setores que pretendem se apresentar como embrião de uma burguesia agrária (empresários), adotando posições ideologicamente espanholeiras, produto das suas próprias frustrações e a da sua incapacidade para se reconhecer no seu papel econômico e social como parte duma nação dependente e sem capacidade de decisão sobre os seus setores produtivos.
O papel colonial da Galiza condiciona a nossa realidade social, assim, só por pôr alguns exemplos; no século XXI seguimos a emigrar ao igual que no século XVIII; assistimos a um envelhecimento progressivo da povoação galega ao tempo que ao despovoamento do rural e à concentração em núcleos urbanos, e esta situação tem o seu reflexo no progressivo desmantelamento dos hospitais do interior do País (Monforte e O Barco de Val de Orras) ou no feche de muitas das nossas escolas rurais. Fenômenos que não se podem desligar da destruição programada da atividade agro-pecuária, do abandono das terras produtivas e a sua substituição por plantações de espécies de crescimento rápido, tipo eucalipto.
É a condição de ser a nossa uma economia dependente a que explica o porquê temos os salários e as pensões mais baixas do Estado Espanhol, e pela contra as portagens mais caras ou os preços mais caros nos combustíveis e na energia que exportamos pese a sua geração causar grandes impactos ambientais e afetar aos nossos recursos naturais. Mas também é a causa e a origem do ataque aos nossos setores produtivos (pescaria, agricultura ou construção naval) e a sua substituição por uma economia de serviços em condições precárias; ou a apropriação dos nossos recursos econômicos por carecer de um setor bancário próprio (banca pública galega) e pela imposição de uma fiscalidade centralizada; e mesmo é o motivo de não contar com indústrias que fechem os ciclos produtivos, como no caso do leite e da produção florestal.
Não escapa a esta mesma analise a situação na que se encontram a língua e a cultura nacional, mas também serve para nos explicar a pouca consciência nacional e sua correlação no que tem a ver com o comportamento eleitoral.
Chegados até aqui, desde o meu ponto de vista o dilema que dá título a este artigo não tem sentido. De sermos quem de explicar bem as causas da nossa emigração secular, do progressivo avelhetamento da povoação galega, da desertificação do rural, do ataque aos nossos setores produtivos, da precariedade laboral, do desmantelamento da sanidade e do ensino público, dos salários e das pensões mais baixas do Estado Espanhol, de ter de suportar as portagens mais altas, de padecer uma espoliação energética e financeira, do ataque ao nosso meio ambiente, ou de porque temos de suportar indústrias tipicamente de enclave como ENCE, e pela contra não contamos com indústrias que fechem os ciclos produtivos; digo, por tanto, que de sermos quem de explicar o mais pedagogicamente possível que a causa destes e de muitos outros problemas estão intimamente relacionados com a nossa dependência colonial estaremos resolvendo adequadamente este suposto dilema.
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