África do Sul critica potências ocidentais
O presidente da África do Sul, uma das principais economias africanas, criticou a NATO e as potências ocidentais pelas suas responsabilidades na tragédia dos refugiados na Europa.
Jacob Zuma expressou na mesma ocasião apoio à criação do Estado da Palestina, rejeitou ingerências visando derrubar o regime na Síria, reafirmou que a África deve ter assento no Conselho de Segurança da ONU como membro permanente e defendeu o direito à autodeterminação do povo do Saara Ocidental.
O dirigente sul-africano, que é também líder do ANC (Congresso Nacional Africano), discursava em Pretória perante diplomatas e jornalistas, antes de viajar para Nova Iorque à frente de uma delegação que participou na 70.ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas. O ANC governa a África do Sul, numa aliança tripartida com o Partido Comunista Sul-africano e a central sindical Cosatu, desde 1994, após a libertação de Nelson Mandela, as primeiras eleições democráticas e o começo da liquidação do apartheid.
Citado pela jornalista Christine Abelkrim-Delanne, da revista «Afrique Asie», Zuma afirmou, num «requisitório sem concessões», que o impacto das guerras e da pobreza no mundo manifesta-se hoje também pela crise dos refugiados na Europa, chegados da Síria, sobretudo, mas também da Líbia, do Iraque, do Afeganistão e de países do Corno de África – que sofreram nos últimos anos agressões militares do imperialismo. E advertiu que não é resposta encerrar as fronteiras, como fizeram alguns estados europeus.
«A terrível tragédia humana de mais de quatro milhões de refugiados sírios lembra-nos a necessidade de encontrar uma solução duradoura, que consiste em acabar com a guerra na Síria», disse o presidente sul-africano. Objectivo que passa pelo diálogo político e por a comunidade internacional rejeitar «todas as acções que visem uma mudança de regime» em Damasco, incluindo uma intervenção militar ou «actos não conformes com a Carta das Nações Unidas», incluindo o apoio a organizações terroristas.
Líbia, Palestina, Saara e os africanos na ONU
Zuma propôs igualmente o diálogo político como via para encontrar uma solução para a Líbia. A propósito, recordou: «Antes da ‘Primavera árabe’ e do assassinato de Kadhafi, não havia refugiados fugindo ou afluindo maciçamente em direcção aos países europeus. O Norte de África estava calmo e a situação era normal. Os bombardeamentos contra a Líbia e o assassinato do seu dirigente originaram um conflito de grande dimensão e graves tensões. A vaga de refugiados, no início partindo de África, foi provocada pela desestabilização. Os bombardeamentos maciços e sistemáticos pelas forças da NATO desestabilizaram a situação e provocaram o conflito, que prossegue na Líbia e nos estados vizinhos. Não se deve esquecer que foi aí que começou o êxodo de refugiados». E mais: «Quando a África apresentou uma proposta de roteiro, para trabalhar com os líbios numa solução, foi ignorada. E agora os que provocaram a desestabilização desta parte do mundo não querem aceitar refugiados. Eles são responsáveis, eles provocaram a crise, devem encontrar uma resposta».
Sobre o Médio Oriente, o presidente da África do Sul acentuou a necessidade do reconhecimento do Estado da Palestina na base das fronteiras de 1967. E insistiu que «não pode haver paz duradoura no Médio Oriente enquanto os palestinianos virem negados o seu direito inalienável a um Estado pacífico, ao lado de Israel, com Jerusalém Oriental como capital».
No que diz respeito ao Saara Ocidental, «a última colónia em África», Zuma declarou que as Nações Unidas devem decidir uma data para a realização do referendo para a autodeterminação do povo saaráui, cujos direitos históricos são defendidos pela Frente Polisário, em luta contra a dominação de Marrocos.
O presidente da África do Sul – uma voz importante, quer pelo peso desse país no continente, quer pela sua participação nos projectos económicos do BRICS, grupo de potências emergentes de que também fazem parte o Brasil, a Rússia, a Índia e a China – abordou ainda outra questão muito actual: os países em desenvolvimento pronunciam-se por uma reforma do sistema das Nações Unidas para que a ONU possa responder melhor aos interesses e às aspirações da maioria dos seus membros.
Nesse contexto, Jacob Zuma realçou que a África, um continente com uma população de mais de mil milhões de habitantes, não tem assento como membro permanente no Conselho de Segurança. Para ele, «um mundo que se pretende justo não pode aceitar que mais de mil milhões de pessoas não tenham representação ao mais alto nível do processo de tomada de decisões».
[Este artigo foi publicado no “Avante!” nº 2184, 8.10.2015]
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