A agenda real B3W-NATO


Para aqueles que se querem poupar à provação de vasculhar o comunicado da cimeira da NATO , aqui está o resumo conciso: A Rússia é uma "ameaça aguda" e a China é um "desafio sistémico".

A NATO, claro, é apenas um bando de garotos inocentes a construir castelos numa caixa de areia.

Outrora, na sua época, Lord Hastings Lionel Ismay, o primeiro secretário-geral da NATO , cunhou o objectivo transatlântico: "manter a União Soviética fora, os americanos dentro e os alemães em baixo".

Com a refundição dos Furiosos anos vinte ( Raging Twenties ), a frase passa a ler-se assim: como "manter os americanos dentro, a UE em baixo e a Rússia-China contidas".

Assim, a organização do Atlântico Norte (itálicos meus) agora relocalizou-se por toda a Eurásia, a combater o que descreve como "ameaças do Leste". Bem, isso é um passo para além do Afeganistão – a intersecção da Ásia Central e do Sul – onde sem cerimónias a NATO foi humilhada por um bando de Pashtuns com Kalashnikovs.


A Rússia continua a ser a ameaça principal – mencionada 63 vezes no comunicado. O actual chefe da NATO, o caniche Jens Stoltenberg, diz que a NATO não se limitará a "reflectir" a Rússia: irá de facto superá-la e cercá-la com múltiplas formações de batalha, pois "implementámos agora os maiores reforços da nossa defesa colectiva desde o fim da Guerra Fria".

O comunicado é categórico: o único caminho para gastos militares é o da subida. Contexto: o orçamento total da "defesa" dos 30 membros da NATO crescerá 4,1% em 2021, atingindo um estarrecedor montante de 1,049 milhão de milhões (trillion) de dólares (US$726 mil milhões dos EUA, US$323 mil milhões de aliados diversos).


Afinal de contas, as "ameaças do Leste" abundam. Da Rússia, há todas aquelas armas hipersónicas que desconcertam os generais da NATO; aqueles exercícios em grande escala perto das fronteiras dos membros da NATO; constantes violações do espaço aéreo; integração militar com aquele "ditador" na Bielorrússia.

Quanto às ameaças da China – Mar do Sul da China, Formosa, o Indo-Pacífico em geral – coube ao G7 sair-se com um plano.

Este pinta-se de "verde" com o "inclusivo" Build Back Better World (B3W) , apregoado como a "alternativa" ocidental à Belt and Road Initiative (BRI). O B3W respeita "os nossos valores" – o qual o cómico britânico Boris Johnson descreveu como construção de infraestrutura de um género mais "neutro" ou "feminino" – e que, no futuro, removerá bens produzidos com trabalho forçado (código para Xinjiang) das cadeias de abastecimento.

A Casa Branca tem a sua própria ênfase quanto ao B3W : trata-se de uma "parceria de infra-estruturas orientada por valores, de alto padrão e transparente" a qual estará a "mobilizar capital do sector privado em quatro áreas de enfoque – clima, saúde e segurança sanitária, tecnologia digital, e igualdade de género – com investimentos catalíticos das nossas respectivas instituições de desenvolvimento".

Os tais "investimentos catalíticos" iniciais para o BW3 foram estimados em US$100 mil milhões. Ninguém sabe como estes fundos virão das "instituições de desenvolvimento".

Observadores da Seasoned Global South já apostam que eles serão fornecidos essencialmente por empréstimos "verdes" do FMI/Banco Mundial ligados ao sector privado de investimento em mercados emergentes seleccionados, com olho no lucro.

A Casa Branca é categórica em que "o B3W terá um âmbito global, desde a América Latina e Caraíbas até a África e ao Indo-Pacífico". Note-se a flagrante tentativa de igualar o alcance do BRI.

Todos estes recursos "verdes" e novas cadeias logísticas serão financiadas por uma variante da chuva dinheiro despejada de helicópteros dos Bancos Centrais, a qual acabaria por beneficiar os membros do G7, mas certamente não a China.


E o "protector" destes novos corredores geoestratégicos "verdes" será – quem mais? – a NATO. Essa é a consequência natural do "alcance global" enfatizado na agenda NATO 2030 .

A NATO como protectora de investimentos


Esquemas de infraestrutura "alternativa" já proliferam, destinados a conter a "intimidação russa" e a "intromissão chinesa" afastadas da UE. Este é o caso da Iniciativa dos Três Mares ( Three Seas Initiative ), onde se supõe que 12 estados-membros da Europa do Leste interconectem melhor os Mares Adriático, Báltico e Negro.

Esta iniciativa é uma cópia pálida do mecanismo 17+1 da China de integração da Europa do Leste como parte do BRI – neste caso forçando-os a construir uma infraestrutura muito dispendiosa para receber importações também muito dispendiosas de energia americana.


A ofensiva contra as "ameaças do Leste" está destinada a falhar.


Dmitry Orlov pormenorizou como "a Rússia é campeã na construção e operação de enormes sistemas de energia, transportes e produção de materiais" e, em paralelo, como "a tecnosfera... tem-se tranquilamente relocalizado e está agora ocupada em tele-trabalho entre Moscovo e Pequim".


Como sabe todo iniciado em computação, a China está à frente no 5G e é o principal mercado do mundo para chips. E agora a Lei de Sanções Anti-Estrangeiro – significativamente aprovada exactamente antes do G7 na Cornualha – "salvaguardará" companhias chinesas de medidas "unilaterais e discriminatórias impostas por países estrangeiros" e da "jurisdição de braço longo" dos EUA, forçando portanto o capital atlanticista a fazer uma escolha .


Foi a China como potência global em ascensão que de facto propôs em primeiro lugar uma "alternativa" para o Sul Global, um contragolpe para a infindável armadilha da dívida do FMI/Banco Mundial das últimas décadas. O BRI é uma estratégia de investimento/desenvolvimento sustentável altamente complexa com o potencial para integrar vastas extensões do Sul Global.


Trata-se de uma conexão directa à famosa teoria do Presidente Mao sobre a divisão dos Três Mundos ; a ênfase de então no Movimento Não Alinhado pós-colonial, do qual a China era um apoiante firme, agora abrange todo o Sul Global. No fim, trata-se sempre de soberania contra neocolonialismo.


O B3W é a reacção ocidental, essencialmente americana, ao BRI: tentar escamotear o maior número possível de projectos enquanto assedia a China ininterruptamente.


Ao contrário da China ou da Alemanha, os EUA dificilmente fabricam produtos que o Sul Global queira comprar. A manufactura representa apenas 5% de uma economia estado-unidense movida essencialmente pelo dólar americano como divisa de reserva e pelo – minguante – Império de Bases do Pentágono.


A China produz dez engenheiros de topo para cada "perito financeiro" estado-unidense. A China aperfeiçoou o que é conhecido entre os técnicos bilingues como um sistema eficaz para fazer planos de desenvolvimento SMART (specific, measurable, achievable, relevant and time-bound) [NT] – e implementá-los.

A noção de que o Sul Global será convencido a privilegiar o B3W – um golpe oco de relações públicas, na melhor das hipóteses – em relação ao BRI é ridícula. No entanto, a OTAN será arregimentada para proteger activamente aqueles investimentos que seguem "os nossos valores". Uma coisa é certa: haverá sangue.

16/Junho/2021
[NT] Específicos, mensuráveis, exequíveis, relevantes e calendarizados.


O original encontra-se no Asia Times e em thesaker.is/the-real-b3w-nato-agenda/


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