O incerto Grupo Lácteo Galego e a integração cooperativa

O incerto Grupo Lácteo Galego e a integração cooperativa
A maioria dos meios de comunicação galegos têm relacionado esta operação com o germe do tão necessário, e longamente demandado, Grupo Lácteo Galego

Está de atualidade a constituição de uma cooperativa de segundo grão, da que inicialmente iam fazer parte as cooperativas FEIRACO, Os Irmandinhos, Melisanto e Jalhas, mas da que depois do pronunciamento da massa social de cada uma delas, em assembleias realizadas em 31 de outubro, se desligou a cooperativa Jalhas.

O nome escolhido para designar esta cooperativa de segundo grão é o de Cooperativas Lácteas Unidas (Clun) e segundo tem declarado o presidente de Melisanto é intenção dos promotores procurar sócios mais lá da Galiza, em Astúrias e Cantábria. Chamam-me muito a atenção duas coisas, que já no nome se evite identificar este projeto com Galiza dando a entender que se renuncia explicitamente a que seja Galiza quem lidere o setor lácteo do Estado espanhol, e por outro, neste mesmo sentido de diluir Galiza no resto do Estado, que estejam a procurar cooperativas parceiras fora da Galiza, sem previamente ter conseguido a plena integração do movimento cooperativo galego, processo iniciado com o projeto de CLESA, mas não rematado.

A maioria dos meios de comunicação galegos têm relacionado esta operação com o germe do tão necessário, e longamente demandado, Grupo Lácteo Galego (GLG). Entendendo por tal a conformação de um complexo industrial destinado a recolher, transformar e comercializar a maior parte do nosso leite, que a dia de hoje, o 80%, está em mãos de empresas de fora da Galiza; um 30% sai da Galiza em cisternas sem transformar e o outro 50% é transformado na Galiza por empresas não galegas, sendo a líder tanto em recolhida como em transformação a multinacional francesa Lactalis.

O primeiro que há que esclarecer é que das primeiras declarações dos presidentes de cada uma das cooperativas participantes neste projeto em nenhum momento se deduz que esteja entre os seus planos conformar um GLG, e de nos ater ao dito pelo presidente de Melisanto à Radio Galega, de que têm vontade de integrar cooperativas de outras latitudes, torna-se mais evidente que o caminho escolhido não leva à criação do GLG.

Os quatro presidentes em conferência de imprensa, celebrada em 10 de outubro, com ocasião de dar a conhecer a proposta de constituição da cooperativa de segundo grão reconheciam que o objetivo da mesma era criar uma cooperativa de referência que permita ganhar tamanho mediante a integração de serviços técnicos, a fabricação e comercialização de rações para alimentação animal, a optimização de subministros ou a redução de custes de produção, mas de momento não se contempla a comercialização do leite conjuntamente. O próprio Diretor Geral de FEIRACO, Jose Luis Antuña, manifestava o dia 12 de outubro a respeito do GLG que há que ir passo a passo. Em nota de imprensa a Conselharia do Meio Rural destacava que a união das cooperativas coincide com a filosofia da Junta da Galiza ao apostar por uma grande empresa líder que defenda os interesses do setor, mas para nada se falava de ir dando os passos para constituir o GLG. E para finalizar fazemo-nos eco das palavras de um artigo de Edelmiro López no que entre outras coisas dizia que “neste aspecto, o pior favor, a esta e outras iniciativas que possam aparece, é criar expetativas que pensamos estão fora da realidade”. Neste mesmo sentido se expressava o presidente da cooperativa Os Irmandinhos, José Angel Blanco, quando expressamente dizia que “há que ir devagar quando se fala do GLG para não gerar expetativas muito grandes”.

Fica claro, pelo tanto, que no que tem a ver com a constituição dum grande Grupo Lácteo Galego são mais os desejos que as realidades. Desejos expressados já no ano 1993 quando no Parlamento Galego se apresentou uma Iniciativa Legislativa Popular demandando a sua criação.

Por quanto ao processo de constituição da cooperativa de segundo grão as expectativas viram-se frustradas na medida em que a massa social da cooperativa Jalhas, de Santa Comba, rejeitou maioritariamente a sua integração. Ajuntamento que conta com bênção da Conselharia do Meio Rural, de acordo com o que dizia a sua própria nota de imprensa, já que “coincide com a filosofia da Junta”, e que lhe viu muito bem para tentar se colgar alguma medalha. Sendo mal pensado, como galego que são, chego a conjeturar que a Conselharia quer aproveitar esta fusão com fins propagandísticos. Não devemos esquecer que Feijoo vem de afirmar que esta legislatura vai ser a legislatura do rural, e para vender esse calote vai necessitar de muita propaganda. Intuo, pelo tanto, que o PP teria movido todos os seus fios para esta operação chegar a bom porto. Neste sentido pode ser sintomático e não anedótico que o presidente da cooperativa Melisanto seja vereador do PP no concelho de Melide, o mesmo do que foi presidenta da Câmara municipal a atual conselheira, mas esta operação pode que não contara com tudo o apoio do PP, o que explicaria o voto em contra da cooperativa Jalhas.

Por outra parte considero que a política que segue da Conselharia do Meio Rural a respeito do apoio aos distintos projetos industriais para transformar e comercializar o nosso leite é quando menos errática e dispersa, por carecer de um desenho estratégico, ou quando menos que se conheça explicitamente.

Nestes momentos temos sobre a mesa uma cheia de projetos no sector, uns em marcha e outros anunciados.

O mais consolidado parece ser o da Associação de Cooperativas Lácteas (ACOLAC), do que fazem parte 10 cooperativas galegas e que exploram as instalações que tinha a antiga CLESA em Caldas de Reis, entre elas FEIRACO, Melisanto e Os Irmandinhos. O que resulta chamativo, e ainda não aclarado, é porque o resto das 7 cooperativas que compartem este projeto industrial não fazem parte da recentemente constituída cooperativa de segundo grão. De ser assim sim que poderíamos acreditar estar perante do germe do GLG, mas parece que se quer optar mais pela via forânea que pela da casa.

Outro projeto em andamento é o de Leite Nosso, liderado por uns 30 gandeir@s com evidentes conexões com a organização agrária socialdemocrata, que comercializa cartões de tetrabrik da marca Deleite. Marca que junto a Muuu eram propriedade da desaparecida, e de infaustas lembranças, Alimentos Lácteos, projeto industrial do que desapareceram 9 milhões de euros e que a dia de hoje nada se sabe, ficando centos de granjas sem cobrar o leite que lhe tinham entregado.  Esta iniciativa vem a competir no mesmo espaço com outras empresas, o leite líquido em cartão, com as que terá de rivalizar por se fazer com uma porção do já saturado mercado, mesmo com marcas de empresas galegas como as de FEIRACO ou as do grupo Lence.

A mais temos a atividade desenvolvida por Dairylac, antigamente conhecida como Lactogal, que se dedica ao tratamento de soros e à elaboração de queijos e nata, tendo previsto construir uma torre de secado de leite proximamente. Na sua página web define-se como uma companhia 100% galega liderada pelas cooperativas ICOS de Chantada e Codeira de Porto-Marim, com a participação da Junta da Galiza a meio de Xesgalicia.

Outro empreendimento já em funcionamento é o de Innolact, empresa que tem a sua origem na Aula de Produtos Lácteos de Lugo da Universidade de Santiago de Compostela, fazendo parte do seu conselho de administração está, entre outros, José Luis Antuña; o seu produto estrela é o queijo fresco em creme, baixo a marca comercial Quescrem.

E por último ainda temos uma série projetos previstos para os anos próximos. O primeiro, anunciado em plena campanha eleitoral ao Parlamento Galego, foi o promovido pela empresa espanhola Goodleit, empresa impulsada por ex-diretivos da multinacional francesa Senoble, hoje em mãos de uma multinacional norte-americana, que tem como data de referência o ano 2018. Além deste temos que a empresa queijeira Entrepinares, que conta com uma fabrica em Vilalba, tem previsto investir uns cinco milhões de euros para acrescentar a sua produção, assim como outra empresa do mesmo ramo, Garcia Baquero, também mostra interesse em fazer-se com as fabricas que Lácteos Pérez Olveira, hoje em processo concursal, tem em Maçaricos e Santa Comba entrando no capital social de Dairylac.

Fica claro que o sector lácteo galego tem potencial (somos a primeira potência produtora do Estado espanhol e a novena de UE) e tem futuro, o que o converte numa talhada apetecível para fazer negócio, o que não fica tão claro é saber qual é o projeto que tem a Junta da Galiza para o nosso leite.

As dúvidas estão em saber qual vai ser o caminho escolhido pela Junta da Galiza, com o seu Presidente à frente, se deixar que empresas de fora da Galiza se façam donas dele, ou se pela contra opta por potenciar um grande Grupo Lácteo Galego de base cooperativo com a participação de capital privado e intervenção da administração galega, ou se mais bem opta por promover a multiplicação de iniciativas, com o ânimo de ir comprando vontades e com o risco de se converter em reinos de taifas a competir entre sim.

Tudo parece indicar que a Junta de Feijoo tem optado por este caminho e procurando ademais a saída mais fácil, porque no caso de fracassarem, com a conseguinte dilapidação de dinheiro público, como aconteceu com Alimentos Lácteos, a administração não vai duvidar em lhe botar a culpa aos e às promotoras pela sua má gestão, mas em nenhum caso vai assumir o seu comportamento irresponsável. Este jeito de proceder vai totalmente a contra dos interesses do nosso sector contar com um potente e diversificado Grupo Lácteo Galego.



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