As crises são mecanismos internos do capitalismo como sistema

Os media, académicos e políticos muitas vezes falam e actuam como se políticas económicas do governo pudessem "resolver" ou "acabar" ou "ultrapassar" crises do capitalismo. Elas não podem.
O capitalismo é tendente a "bolhas" recorrentes (especulações descontroladas em activos reais ou instrumentos financeiros, investimento excessivo em capacidade produtiva, etc) que podem ameaçar a sua sobrevivência. Portanto, ele tem desenvolvido crises (aumento do desemprego, bancarrotas, arrestos) para "corrigir" as suas bolhas. Hoje, por exemplo, após anos de concessão de crédito sem controle e de uma insustentável bolha da indústria habitacional, uma crise aqueles excessos eliminando milhares de milhões em dívidas, levando ao colapso os preços das casas e assim por diante. No fim da década de 1990, após anos de especulações descontroladas do mercado de acções e de preços das mesmas insustentáveis, uma crise em 2000 corrigiu aqueles excessos desmoronando os preços das acções. Em ambos os exemplos, as correcções implicaram o sofrimento em massa associado ao desemprego, bancarrotas (especialmente de negócios de pequena e média dimensão), crises fiscais que cortaram serviços públicos, pensões e outros fundos sociais reduzidos e assim por diante.
O método do sistema capitalista de auto-curar-se é a crise. Quando uma das suas bolhas recorrentes explode, riqueza é destruída, pessoas são despedidas e instalações de produção são encerradas numa espiral descendente de contracção. Finalmente, os cada vez mais desesperados desempregados, sub-empregados e os ainda empregados que temem perder o emprego aceitam salários mais baixos e menos benefícios. Da mesma forma, empresas em bancarrota ou submetidas a downsizing desfazem-se de maquinaria ociosa no mercado de segunda mão, arrendam menos espaço, compram menos inputs, fazem menos publicidade, etc. Os custos de equipamento, espaço, materiais e anúncios então caem juntamente com as quedas de salários e as reduções de benefícios. Os custos cairão até que os negócios vejam lucros outra vez na contratação de trabalhadores e retomada da produção. A crise fez então a sua tarefa. A recuperação arranca e o capitalismo começa a ascender para a bolha seguinte quando todo o ciclo se repete.
As políticas do governo ao longo dos últimos dois séculos de ascendência do capitalismo nunca terminaram nem substituíram as crises como o método do sistema para corrigir excessos capitalistas. Nem tão pouco políticas do governo impediram que tais excessos se repetissem. Os dois excessos mais recentes (a bolha do mercado de acções da década de 1990 e a bolha imobiliária/do crédito de 2004-07) e as duas crises resultantes provam isso. O capitalismo mantém-se a gerar excessos seguidos por crises seguidos por excessos. É assim que o sistema funciona.
As actividades do governo durante as crises servem tipicamente três finalidades principais. Políticas de bem-estar social amenizam ou pelo menos dão mostras de amenizar o sofrimento da massa enquanto a crise prossegue para corrigir os excessos anteriores. Segundo, políticas financeiras estimulam e regular empresas privadas e salvam também aquelas firmas cujo fracasso iminente poderia comprometer o sistema. Tais políticas podem diminuir os extremos da crise enquanto ela prossegue a fim de corrigir os excessos anteriores. Terceiro, declarações do governo atribuem a culpa pelos sofrimentos provocados pela crise a "causas" diferentes do funcionamento interno e de rotina do sistema capitalista. Responsáveis conservadores enfatizam que (1) o sofrimento das massas é o preço que "devemos pagar" para corrigir excessos que eles atribuem aos trabalhadores ou ao governo ou a ambos e (2) "deveríamos confiar" nos negócios privados (livres de constrangimentos impostos pelo governo ou pelos trabalhadores) para ultrapassar aqueles excessos. Responsáveis liberais pressionam por aliviar o sofrimento da massa associado à crise enquanto insistem em que (1) os excessos passados foram provocados por "maçãs podre cobiçosas" e mercados "não regulados"e (2) intervenções do governo ultrapassarão a crise actual e impedirão crises futuras. A crítica do capitalismo como sistema é impossível –literalmente impensável– tanto para uns como para outros.
As políticas do governo são principalmente camuflagens para os ciclos penosos da instabilidade inerente ao capitalismo. Na melhor das hipóteses, elas suavizam as pontas mais agudas das crises. Porque os capitalistas opõem-se à mudança ou mesmo ao questionamento do sistema, as crises recorrentes são deixadas como o instrumento principal para corrigir os excessos recorrentes. Os capitalistas tornam as políticas do governo impotentes utilizando os lucros que eles tomam directamente das suas empresas (lobbying, subornos, etc) ou indirectamente (relações públicas). Políticos dependentes do apoio de capitalistas mostram "preocupação" pelo sofrimento da massa enquanto limitam o que o governo realmente faz para as três encenações acima listadas. Previsivelmente, as políticas do governo nunca chegam à raiz do problema das crises.
Tal problema é o sistema capitalista com suas profundas tensões embutidas dentro de si. No interior de todas as empresas, lutas infindáveis entre trabalhadores e capitalistas provocam decisões (exemplo: sobre salários e benefícios) que levam a crises. Conflitos entre conselho de administração e accionistas provocam decisões (exemplo: super-investimentos) que contribuem para crises. A competição de mercado entre empresas provoca decisões (exemplo: mais outsourcing para empresas com salários miseráveis) que moldam as crises. O capitalismo como sistema económico estrutura conflitos internos entre os seus participantes que reiteradamente geram excessos e crises.
Uma resposta óbvia às crises seria questionar o sistema capitalista que as produz e reproduz. Isto leva logicamente a avaliar sistemas económicos alternativos. Podemos reorganizar empresas de modo a que os trabalhadores se tornem os seus próprios empregadores colectivos para ajudar a ultrapassar a instabilidade imposta pelo capitalismo? Pode o planeamento económico local, regional e/ou nacional feito por agências democraticamente responsáveis finalizar os caminhos com que a competição de mercado produz bolhas e fracassos? Pode a substituição da propriedade privada (contestando corporações e seus accionistas) por um sistema de propriedade colectiva, socialmente responsável, ajudar a reduzir os excessos económicos e as crises?
Longe de responder a estas questões chave, a maior parte das discussões sobre a crise ignora-as. Elas continuam tabus porque (e enquanto) os capitalistas tiverem o incentivo e os recursos para sustentar a sua proibição do questionamento do sistema. Portanto, sabichões, políticos e professores, continuem a actuar como se isto fossem assuntos há muito arrumados, como se nenhuma alternativa ao capitalismo existisse ou valesse a pena considerar. Faltando a coragem para questionar o sistema, eles limitam as políticas governamentais apenas a camuflagens impotentes.
Mas a própria crise do capitalismo mina os seus tabus. O número e a influência social dos críticos do capitalismo estão outra vez a crescer. As injustiças do sistema, os desperdícios materiais e os imensos custos humanos provocam o questionamento e a crítica que podem identificar as mudanças necessárias para finalmente romper o ciclo de excessos e de crise. A dialéctica da contradição, a velha toupeira, assalta novamente o capitalismo.
O capitalismo é tendente a "bolhas" recorrentes (especulações descontroladas em activos reais ou instrumentos financeiros, investimento excessivo em capacidade produtiva, etc) que podem ameaçar a sua sobrevivência. Portanto, ele tem desenvolvido crises (aumento do desemprego, bancarrotas, arrestos) para "corrigir" as suas bolhas. Hoje, por exemplo, após anos de concessão de crédito sem controle e de uma insustentável bolha da indústria habitacional, uma crise aqueles excessos eliminando milhares de milhões em dívidas, levando ao colapso os preços das casas e assim por diante. No fim da década de 1990, após anos de especulações descontroladas do mercado de acções e de preços das mesmas insustentáveis, uma crise em 2000 corrigiu aqueles excessos desmoronando os preços das acções. Em ambos os exemplos, as correcções implicaram o sofrimento em massa associado ao desemprego, bancarrotas (especialmente de negócios de pequena e média dimensão), crises fiscais que cortaram serviços públicos, pensões e outros fundos sociais reduzidos e assim por diante.
O método do sistema capitalista de auto-curar-se é a crise. Quando uma das suas bolhas recorrentes explode, riqueza é destruída, pessoas são despedidas e instalações de produção são encerradas numa espiral descendente de contracção. Finalmente, os cada vez mais desesperados desempregados, sub-empregados e os ainda empregados que temem perder o emprego aceitam salários mais baixos e menos benefícios. Da mesma forma, empresas em bancarrota ou submetidas a downsizing desfazem-se de maquinaria ociosa no mercado de segunda mão, arrendam menos espaço, compram menos inputs, fazem menos publicidade, etc. Os custos de equipamento, espaço, materiais e anúncios então caem juntamente com as quedas de salários e as reduções de benefícios. Os custos cairão até que os negócios vejam lucros outra vez na contratação de trabalhadores e retomada da produção. A crise fez então a sua tarefa. A recuperação arranca e o capitalismo começa a ascender para a bolha seguinte quando todo o ciclo se repete.
As políticas do governo ao longo dos últimos dois séculos de ascendência do capitalismo nunca terminaram nem substituíram as crises como o método do sistema para corrigir excessos capitalistas. Nem tão pouco políticas do governo impediram que tais excessos se repetissem. Os dois excessos mais recentes (a bolha do mercado de acções da década de 1990 e a bolha imobiliária/do crédito de 2004-07) e as duas crises resultantes provam isso. O capitalismo mantém-se a gerar excessos seguidos por crises seguidos por excessos. É assim que o sistema funciona.
As actividades do governo durante as crises servem tipicamente três finalidades principais. Políticas de bem-estar social amenizam ou pelo menos dão mostras de amenizar o sofrimento da massa enquanto a crise prossegue para corrigir os excessos anteriores. Segundo, políticas financeiras estimulam e regular empresas privadas e salvam também aquelas firmas cujo fracasso iminente poderia comprometer o sistema. Tais políticas podem diminuir os extremos da crise enquanto ela prossegue a fim de corrigir os excessos anteriores. Terceiro, declarações do governo atribuem a culpa pelos sofrimentos provocados pela crise a "causas" diferentes do funcionamento interno e de rotina do sistema capitalista. Responsáveis conservadores enfatizam que (1) o sofrimento das massas é o preço que "devemos pagar" para corrigir excessos que eles atribuem aos trabalhadores ou ao governo ou a ambos e (2) "deveríamos confiar" nos negócios privados (livres de constrangimentos impostos pelo governo ou pelos trabalhadores) para ultrapassar aqueles excessos. Responsáveis liberais pressionam por aliviar o sofrimento da massa associado à crise enquanto insistem em que (1) os excessos passados foram provocados por "maçãs podre cobiçosas" e mercados "não regulados"e (2) intervenções do governo ultrapassarão a crise actual e impedirão crises futuras. A crítica do capitalismo como sistema é impossível –literalmente impensável– tanto para uns como para outros.
As políticas do governo são principalmente camuflagens para os ciclos penosos da instabilidade inerente ao capitalismo. Na melhor das hipóteses, elas suavizam as pontas mais agudas das crises. Porque os capitalistas opõem-se à mudança ou mesmo ao questionamento do sistema, as crises recorrentes são deixadas como o instrumento principal para corrigir os excessos recorrentes. Os capitalistas tornam as políticas do governo impotentes utilizando os lucros que eles tomam directamente das suas empresas (lobbying, subornos, etc) ou indirectamente (relações públicas). Políticos dependentes do apoio de capitalistas mostram "preocupação" pelo sofrimento da massa enquanto limitam o que o governo realmente faz para as três encenações acima listadas. Previsivelmente, as políticas do governo nunca chegam à raiz do problema das crises.
Tal problema é o sistema capitalista com suas profundas tensões embutidas dentro de si. No interior de todas as empresas, lutas infindáveis entre trabalhadores e capitalistas provocam decisões (exemplo: sobre salários e benefícios) que levam a crises. Conflitos entre conselho de administração e accionistas provocam decisões (exemplo: super-investimentos) que contribuem para crises. A competição de mercado entre empresas provoca decisões (exemplo: mais outsourcing para empresas com salários miseráveis) que moldam as crises. O capitalismo como sistema económico estrutura conflitos internos entre os seus participantes que reiteradamente geram excessos e crises.
Uma resposta óbvia às crises seria questionar o sistema capitalista que as produz e reproduz. Isto leva logicamente a avaliar sistemas económicos alternativos. Podemos reorganizar empresas de modo a que os trabalhadores se tornem os seus próprios empregadores colectivos para ajudar a ultrapassar a instabilidade imposta pelo capitalismo? Pode o planeamento económico local, regional e/ou nacional feito por agências democraticamente responsáveis finalizar os caminhos com que a competição de mercado produz bolhas e fracassos? Pode a substituição da propriedade privada (contestando corporações e seus accionistas) por um sistema de propriedade colectiva, socialmente responsável, ajudar a reduzir os excessos económicos e as crises?
Longe de responder a estas questões chave, a maior parte das discussões sobre a crise ignora-as. Elas continuam tabus porque (e enquanto) os capitalistas tiverem o incentivo e os recursos para sustentar a sua proibição do questionamento do sistema. Portanto, sabichões, políticos e professores, continuem a actuar como se isto fossem assuntos há muito arrumados, como se nenhuma alternativa ao capitalismo existisse ou valesse a pena considerar. Faltando a coragem para questionar o sistema, eles limitam as políticas governamentais apenas a camuflagens impotentes.
Mas a própria crise do capitalismo mina os seus tabus. O número e a influência social dos críticos do capitalismo estão outra vez a crescer. As injustiças do sistema, os desperdícios materiais e os imensos custos humanos provocam o questionamento e a crítica que podem identificar as mudanças necessárias para finalmente romper o ciclo de excessos e de crise. A dialéctica da contradição, a velha toupeira, assalta novamente o capitalismo.