Tempos medievais
Feiras inspiradas nos mercados medievais ou tentando reconstruir a vida quotidiana na Idade Media proliferan pela Galiza nos verões. Está na moda uma espécie de Idade Media de faz-de-conta. Filmes e fantasias inspiradas num ambiente medieval eivado de magias servem de inspiraçao mental para se faça un négocio de empresas específicas e se ofertem aos autarcas e vereadores da cultura de vilas e cidades galegas. Asím Mondonhedo, Monforte de Lemos, Ourense, Betanços, Ponte Vedra ou Petím são alvo de uma oferta "cultural" mostrada pelo mesmo padrão. Fadas, principes encantados, cavalleiros, desfilam por un palco escénico dos bairros antigos desses lugares. Mas ao contrario dessas representações viver naqueles tempos não era muito agradável. O povo trabalhava nos campos de sol a sol, usaba uma roupa velha e esfarrapada, andavan descalços, viviam nuns casebres escuros e insalubres, pasaba fome, pois nem sequer estava autorizado a caçar. A nobreza usabam umas roupagens consideradas belas naquela altura, mas sujas e remendadas, não liam ou escreviam, pois não sabiam. O tempo mediase pela altura do Sol e pelos toques dos sinos das igrejas.
Estes pequenos traços servem de ilustração para que se faga uma comparativa co espectáculo que é oferecido pelas empresas organizadoras destas feiras. Na totalidade dos mercados medievais galegos fala-se castelhano por parte dos lojistas, vendedores e artistas. As etiquetas dos produtos ou objetos que indicam os preços ou outras informações á venda estão em castelhano. E aconteçe que as empregas organizadoras são de fóra da Galiza e, se se lhe reclama que rotulem em galego, excusam-se justificando que também trabalhan para o estrangeiro. Em uma das minhas descolações a estes mercados comprobei que a mesma marca comercial de sabonetes vendía os mesmos produtos numa vila de Portugal, mas lá si estava em galego. Guardei no fardel o título comprovativo que, a modo de publicidade, me ofereciam pela compra dos sabonetes. Esta é, aliás, uma das não menores contradições destas feiras medievais para a lingua e culturas propias. Outras artificialidades, e não trato de ser integrista, são de tipo estético. Como se diz máis acima, as roupagens, os espectáculos a cavalo, a grande trapalhada dos mouros e cristãos com cantinhos reservados a espaços para os mouros não reflitem nem asemelham um cheirinho ao medievo. A crueza daqueles tempos, o execrável comportamento dos fidalgos e da nobreza, a miséria com que vivia o povo, o apodrecimento da Igreja que controlava e ditava todos os pasos da vida, do nascimento a morte, inspirando terrores consubstanciado nas chamas do inferno, são os traços duma História da que se falsifica por uns personagens da treta.
Se puderamos voltar a fazer comparativas com os nossos días no caso da música que se ouve neses mercados botariamos a mão a um CD reeditado de dona Amália Rodrigues. Amália Rodríguez no medievo? Sim, a grande Amália gravou un disco vinil em 1971 de nome "Cantigas d'Amigos" o máis raro e conhecido dos discos de Amália junto com Ary dos Santos e Natália Correia que anuncia a preparaçao do livro "Cantares dos Trovadores Galego-Portugueses" (colectánea de poesía medieval em português actualizado, publicado em 1970). Eis uma música para ambientar as feiras medievais galegas; as incursões de Amália pela poesía trovadoresca, cantando a Paio Gomes Charinho, João Airas de Santiago e para os autarcas e vereadores da cultura das vilas e cidades medievais galegas.