Aquis Querquernis (lea-se cuercuernis) e o centro de interpretação...
Que interpreta o centro de interpretação de Aquis Querquernis?
Antes de responder (pode-se responder sem molestar ninguém?) a esta pergunta vou explicar, para quem não conheça, quê cousa é Aquis Querquernis.
Este latinório designa uma das mansiones da via XVIII Antonina ou Via Nova que unia (e dalgum modo ainda une) Bracara Augusta, mais conhecida como Braga, com Asturica Augusta, mais conhecida como Astorga, duas importantes cidades da Gallaecia no tempo do império romano (séc. I a séc. V) e ainda no tempo do reino dos suevos. No lugar, chamado hoje Porto Quintela, no concelho de Bande, Ourense, pode-se achar, a pouca distância um do outro, dous restos arqueológicos hoje em processo de excavação. Um é a mansio (sorte de pousada para viageiros) e o outro, um acampamento romano (tal vez fora melhor dizer quartel, visto o aspecto pouco provisional da construção, significado ao que parez remeter o termo acampamento).
,Ambos os jazigos arqueológicos parecem-me muito interessantes tanto pola sua importância como pola sua conservação e reconstrução. Animo a quem não os conhecer ainda, vá conhecê-los, vale a pena. Mas não é esse o motivo do meu escrito de hoje.
O motivo deste escrito é o centro de interpretação que se fez com motivo de tais interessantes achados arqueológicos. Mais exactamente com os contidos, organização e estética, critérios, seriedade e idoneidade didácticas de tais contidos. O espaço está distribuido em tres espaços visitáveis.
,Um espaço amplo, quadrado, com repressentações mitológicas, que não julgarei desde o ponto de vista estético, no piso e no teito. Abaixo Possídon e outras deidades e seres mitológicos marinhos e no alto os deuses olímpicos com Zeus á cabeça. Desde esse espaço um pode aceder, á direita segundo se entra, a um espaço menor, destinado a projectar um video informativo sobre o ámbito arqueológico que deu motivo ao centro de “interpretação”. Também desde esse “vestíbulo”, que ali chamam hall, e na mesma direcção pode um aceder ao mostrador onde a persoa encargada recebe as visitas.
Do lado oposto o visitante accede, entre dous bustos dourados (!) de imperadores romanos, não identificados por mim, á área de exposição. Esta consta de dous níveis ou andares. Em baixo o referido a Roma, em riba o referido aos habitantes do território, mais conhecidos, seica, por Querquernos (lea-se cuercuernos).
Não vou desentranhar o particular destes dous âmbitos. Seria longo e pesado. Ainda mais do que está ressultando este escrito. Apenas tres ou quatro detalhes para os que ressultam imprescindíveis a ilustrações com que os acompanho.
Alguns dos que me lem lembrarám o dicionário escolar Vox de latim, que tanto se usava em tempos, quando o latim era matéria essencial nos estudos de bacharelato. Dele parecem tiradas as ilustrações que profusamente e sem critérios inteligível ilustram os paineis do apartado romano sobre a via, os transportes e viageiros... Observe-se a fotografia tirada e recortada dum dos paineis... e o comentário: emigrantes (!!!)
,Noutro lugar, ao pé dos paineis, no que se faz referência ao transporte marítimo (discutir se um centro de interpretação há de abranguer a totalidade do fenómeno “deslocamento” incluindo o marítimo num lugar como Bande, capital portuária onde as haja, é asunto doutro momento), nesse lugar, digo, podemos ver uma reprodução 3D da ilustração do dicionário Vox do concepto navis honeraria, quer dizer, nave de carga. Não é uma maqueta a escala, reconstrução duma nave de carga do período romano, não.
Estes são, apenas, dous exemplos do discutível critério para “ilustrar” os conceitos de viagem, transporte e outros afins como meios de transporte. Na minha opinião, o critério é rissível e ridículo até o extremo, cum critério de “Roma” e “romanização” de estudante da ESO pouco avantajado.
Mas os exemplos que seguem estám noutra ordem de cousas. Nestes casos já não está em questão a desafortunada ou pouco acertada selecção dos “exemplos”. Nestes casos incorre-se, por parte dos encargados de projectar, musealizar e manter o centro, num bochornoso desatino técnico desde o ponto de vista histórico, arqueológico, artístico...
Eis o primeiro caso
,Darío derrotado ao pé do faro Brecantio
Obviamente o título de acima é meu. A montagem fotográfica, não.
No centro pouco ou nada de informação se proporcionava (neste e na maioria dos casos) e de o fazerem adoitava ser inexacta ou duvidosa. Ainda a “pedra fita” do jardim da entrada do centro (ilustraçõ 1) está sem nenhuma referência de qualquer tipo. Nem denominação, nem data, nem local do achado, nem interpretação... nada. Se alguém quer saber, que pergunte! E o mais curioso é que o original fica no exterior, à intempérie, mentres que no interior uma reprodução em material oco se mantém a salvo da inclemência do clima. Que modo tão sutil de valorar e preservar o património.
Voltemos ao Darío em Brecantio. A fotografia de acima, tirada por quem subscreve, ilustra um dislate histórico e conceptual que marca um fito poucas vezes atingido... excepto por estudantes pouco avantajados dos primeiros níveis da ESO.
Mas qual o critério para perder o tempo e o dinheiro em realizar tão patética montagem fotográfica? Uma montagem que reune a torre de Hércules actual, sita na cidade da Corunha, no Ocidente da Peninsula Ibérica, e um mossaico romano sobre um rei Aqueménide de Pérsia (cca. 380-330 ane) em processo de ser derrotado por Alexandre Magno em Isso. Que propósito pode ter semelhante aberração? Ilustrar... o quê? Amostrar um meio de transporte (digo-o pola quadriga do monarca)? Ou apenas fazer bonito? Tal vez o fio conector seja que Hércules e o mossaico são “romanos”, suponho!
Quem teve a ideia genial? Quem supervisou os trabalhos? Quem deu permisso para realizar o híbrido cronotópico? Quem pagou a verba deste dislate? Eis uma amostra da nossa situação cultural. Pagamos quantidades ingentes de dinheiro para que uns ignorantes perpetrem qualquer atentado ao rigor histórico, científico ou a qualquer outra disciplina, á ética ou á estética.
,O xermolo da Gallaecia
A seguir outro “acerto” mas de signo bem diferente. No painel que forma ángulo com o de Dario achamos uma narração de como o concepto Gallaecia “foi calando na conciencia colectiva” (a dizer do anónimo autor do texto. Não surpreende que seja anónimo... pola vergonha de ter o nome exposto em semelhante desfeita). O abraiante não é o tom do texto, que poderia ser defendível. O impresentável é a ilustração. De novo a mais bizarra discronia para repressentar como “abrolla o xermolo da futura Gallaecia” (parafraseando livremente). Ei-la: Um meninho “gaiteiro” vestido co trajo tradicional... do século XIX adequadamente agionarto.
Nesta altura fico sem palavras... e de certo muitos dos que leam isto ficaram tão pampos como fiquei eu no momento. Sem palavras.
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