As portas que Abril abriu
Celébran-se por todo o País atos do quarenta aniversario do 25 de abril e dos restos da Revolução dos Cravos que mudou Portugal e a abalou às nações peninsulares. Interroga-se toda a sociedade política portuguesa se valeu a pena. As duas ditaduras ibéricas estavam nos estertores, mas faltava arrancar do poder as figuras dos regimes presas ao modelo que todos percebíam gritantemente esgotado.
Toda uma geração interpretou que tinha que, com a generosidade pessoal, sacrificar-se pelo bem común. Essa geração nunca foi reconhecida, nem será no futuro, porquê, incompresivelmente para as apetências humanas, não quiz nada para si, nem material nem procurou honras nem glórias. Todas essas figuras do 25 de Abril foram a posteriori esquecidas como uma condena a um exilio político cruel pela sociedade que se entregou aos prazeres e delícias do sistema capitalista, mas matou o futuro político participativo em forma de sistema convencional que, infelizmente, desembocou no colapso e corrupção dos tempos críticos de hoje.
A imprensa sistémica galega e espanhola, ela também corrupta, celebrará este 25 de abril instrumentalizando mais uma vez os símbolos dos "cravos", do "Grândola", dos "capitães de abril" para lembrar feitos irrepetíveis, mas desnecessários para os tempos de hoje, como uma fossilização da história para que a sociedade não poida aprofundar na lição aprendida, que leve a encarar uma mudanza profunda do sistema capitalista. Para os doctrinarios da banca corrupta o 25 de abril trouxe um males dos que ainda hoje não nos livramos e uma parte importante "apolítica" da sociedade portuguesa acredita que, efectivamente, o 25 foi um erro histórico, pois essas liberdades atingidas com a revolução derão lugar aos males do presente.
Muitos pensadores da esquerda portuguesa concluém que o antigo regime sobreviveu ao 25 de abril, matando o futuro por muitos anos. Também passou assím no estado espanhol. Duas geraçãos confrontam-se hoje numa realidade sem diálogo; a dos que viveram anteriores ao 25 de abril e a dos "post-25 de abril", dos que, numa sociedade que quiz apagar a infausta memória do estado novo privou do conhecimento das atrocidades do regime ditatorial os seus sucessores e aos que, numa leitura histórica aberrantemente contemporánea, qualifica os militares de Abril como uns chatos, uns hominhos sem relevo.
Portugal vive ainda hoje as liberdades do 25 de Abril. Nada aconteceu, após 40 anos de história, politicamente melhor que o 25 de Abril. Reivindiquemos o 25 de Abril como o facto do relâmpago que ilumina hoje as nossas vidas e o nosso benestar. O discurso económico, os mercados, o dinheiro tudo intenta apagar e tomou conta de tal forma do espaço político que nada é possível sem essas vozes imperantes. Intentam trasladar ás nossas mentalidades a resignação e submissão política.
Foi com espanto e alguma expectativa que, no dia 25 de Abril de 1974, o mundo assiste ao derrube de uma das mais longas ditaduras europeias da altura. Já os últimos anos da ditadura eram de profunda crise. Quando, a 16 de março (quarenta anos fez ontem), um grupo de oficiais do Regimento de Infantaria das Caldas da Rainha leva a cabo uma tentativa de golpe de estado, os seus dias estavan já contados. Os meios estudantís em crescente efervescência apurados pelas organizações da extrema esquerda, os meios católicos progressistas agitados, uma comunidade internacional escandalizada com os massacres em Africa e, enfim, uma sociedade consciente, apesar de haver dois milhões de cidadãos analfabetos, os días da fim estavam já contados.
Economicamente o panorama também não era animador. Apesar do seu bom desempenho nos primeiros anos do consulado marcelista, o impacto da crise petrolífera de 1973 deixa patentes as debilidades e deficiências estruturais da economia portuguesa do estado novo.
A mensagem que, cerca de um ano antes do 1974, José Medeiros Ferreira enviara ao III Congresso Republicano de Aveiro, atribuíndo às Forças Armadas a missão de Democratizar, Descolonizar e Desenvolver, estava prestes a encontrar uma concretização prática. Estes tres D são, ainda hoje, reivindicados pelas forças políticas nacionais galegas. Por todas as forças políticas galegas? Não por todas como bem saberá o caro leitor. Uma recente força que se reivindica como nacionalista não se assume como "descolonizadora" da Galiza. Mais uma porta que Abril deve abrir, uma porta nas consciências nacionais da Galiza.