Roubo ou exploração?
Toda a nossa riqueza foi roubada pela grande finança e, ao fazê-lo, a grande finança pôs a nossa economia de joelhos
Resenha do livro Stolen, de Grace Blakeley
Toda a nossa riqueza foi roubada pela grande finança e, ao fazê-lo, a grande finança pôs a nossa economia de joelhos. Portanto, devemos nos livrar da grande finança. Esta é a mensagem abreviada de um novo livro, Stolen – how to save the world from financialisation (Stolen – como salvar o mundo da financiarização), de Grace Blakeley.
Grace Blakeley é uma estrela em ascensão no firmamento da esquerda radical do movimento trabalhista britânico. Ela licenciou-se em política, filosofia e economia (PPE) na Universidade de Oxford e fez um mestrado em estudos africanos. A seguir Blakeley foi investigadora do Institute of Public Policy Research (IIPPE), um "think tank" de esquerda, e agora tornou-se o correspondente económico da revista de esquerda New Statesman. Blakeley é uma comentarista habitual e apoiante de ideias de esquerda em vários media da Grã-Bretanha. Seu perfil e popularidade elevaram seu livro, publicado esta semana, ao top 50 de todos os livros da Amazon.
Roubado: como salvar o mundo da financiarização é um relato ambicioso das contradições e fracassos do capitalismo do pós-guerra ou, mais exactamente, do capitalismo anglo-americano (porque o capitalismo europeu ou asiático é pouco mencionado e a periferia da economia mundial é coberta apenas de passagem). O livro pretende explicar como e porque o capitalismo se transformou na ladroagem do modelo da "financiarização", beneficiando poucos, enquanto destruindo (roubando?) o crescimento, o emprego e o rendimento de muitos.
Stolen conduz o leitor através dos vários períodos do desenvolvimento capitalista anglo-americano de 1945 até a Grande Recessão de 2008-9 e além. E termina com algumas propostas de política para acabar a roubalheira com um novo modelo económico (pós-financiarização) que beneficiará os trabalhadores. Isto é algo atraente. Mas o relato de Blakeley acerca da natureza do capitalismo anglo-americano moderno e das causas das crises recorrentes na produção capitalista estará correcto?
Comecemos pelo título do livro de Blakeley: "Roubado". É um título atraente para um livro. Mas ele implica que os proprietários do capital, especificamente o capital financeiro, são ladrões. Eles têm "roubado" a riqueza produzida por outros; ou eles "extraíram" a riqueza daqueles que a criaram. Isto é lucro sem exploração. Na verdade, o lucro agora vem simplesmente do roubo dos outros.
Marx chamou a isto de "lucro de alienação". Para Marx, ele é alcançado pela transferência da riqueza existente (valor) criada no processo de acumulação e produção capitalista. Mas o valor não é criado por este roubo financeiro. Para Marx, os lucros, ou valor excedente (surplus value), como os chamava Marx, são criados apenas através da exploração do trabalho na produção de mercadorias (coisas e serviços). A riqueza dos trabalhadores não é "roubada", nem a riqueza que eles criam. Sob o capitalismo, os trabalhadores recebem um salário dos empregadores pelas horas em que trabalham, conforme negociado. Mas eles produzem mais valor no tempo trabalhado do que o valor (medido em tempo de trabalho) que recebem em salários. Assim, os capitalistas obtêm uma mais-valia com a venda das mercadorias produzidas pelos trabalhadores de que eles se apropriam como donos do capital. Isto não é roubo, mas exploração. (Ver meu livro, Marx 200 , para uma explicação mais completa).
Importa se é roubo ou exploração? Bem, Marx pensava que sim. Ele argumentou ferozmente contra a ideia de Pierre-Joseph Proudhon, o socialista mais popular daquele tempo de que "a propriedade é um roubo". Dizer isso, argumentou Marx, era deixar de ver a maneira real pela qual a riqueza criada por muitos e como ela acaba nas mãos de poucos. Portanto, não estava em causa acabar com o roubo, mas sim com o capitalismo.
Em Stolen, Blakeley ignora a mais importante descoberta científica (como Engels afirmou), ou seja, a mais-valia. Ao invés disso, Blakeley engole completamente os pontos de vista dos modernos Proudhonianos como Costas Lapavitsas, David Harvey e outros como Bryan e Rafferty, os quais rejeitam a visão de Marx de que o lucro vem da exploração do trabalho. Para eles, isso é velho. Agora, o capitalismo moderno é o "capitalismo financiarizado", que obtém a sua riqueza roubando ou extraindo "rendas" de todos, não da exploração do trabalho. Isto leva Blakeley ao ponto de aceitar a falsa análise de Thomas Piketty de que os retornos ao capital aumentarão inexoravelmente através deste processo – quando a evidência é de que os retornos ao capital têm estado a cair inexoravelmente – ver aqui minha crítica a Piketty .
Mas estes argumentos "modernos" são tão falsos quanto os de Proudhon. Lapavitsas foi bem criticado pelo marxista britânico Tony Norfield ; eu envolvi David Harvey no debate sobre a teoria do valor de Marx e Bryan e Rafferty foram considerados falhos pelo marxista grego Stavros Mavroudeas . Depois de ler estas críticas, pode-se perguntar se a lei do valor de Marx pode ser ignorada ao explicar as contradições do capitalismo moderno.
Depois, há o subtítulo do livro de Blakeley: "Como salvar o mundo da financiarização". "Financiarização" como categoria ou termo tornou-se extremamente popular na teoria económica heterodoxa. A categoria veio originalmente da economia convencional, foi adoptada por alguns marxistas e promovida por economistas pós-keynesianos. Seu objectivo era explicar as contradições dentro do capitalismo e suas crises recorrentes com uma teoria que não envolvesse a lei do valor de Marx e a lei da lucratividade – ambas as quais os pós-keynesianos rejeitam ou ignoram ( ver minha carta à Monthly Review ).
Blakeley toma a definição do termo de Epstein, Krippner e Stockhammer e faz dela a peça central da narrativa do livro (p.11). Como esbocei num post anterior , se o termo significa simplesmente um aumento do papel do sector financeiro e um aumento da sua participação nos lucros nos últimos 40 anos, isso é obviamente verdade – pelo menos nos EUA e no Reino Unido. Mas se significa "a emergência de um novo modelo económico ... e uma profunda mudança estrutural no modo como a economia (capitalista) funciona" (Krippner), então trata-se de um jogo totalmente novo.
Como Stavros Mavroudeas coloca em seu excelente e novo artigo ( 393982858-QMUL-2018-Financialisation-London ), a "hipótese da financiarização" considera que "o capital monetário se torna totalmente independente do capital produtivo (pois pode explorar directamente o trabalho através da usura) e remodela as outras fracções do capital de acordo com suas prerrogativas". E se os "lucros financeiros não são uma subdivisão da mais-valia, então ... a teoria da mais-valia é, pelo menos, marginalizada. Consequentemente, a lucratividade (as principais diferenças específicas da análise económica marxista em relação à economia neoclássica e keynesiana) perde sua centralidade e o juro é autonomizado a partir dele (ou seja, do lucro – MR)".
E é claramente assim que Blakeley o encara. Aceitar este novo modelo implica que o capital financeiro é o inimigo e não o capitalismo como um todo, ou seja, excluindo os sectores produtivos (criadores de valor). Blakeley nega esta interpretação no livro. As finanças não são uma camada separada de capital sentada no topo do sector produtivo. Isso porque todo o capitalismo está agora 'financiarizado!': "qualquer análise que veja a financiarização como uma "perversão" de uma forma mais pura e produtiva de capitalismo falha na apreensão do contexto real. O que emergiu na economia global nas últimas décadas é um novo modelo de capitalismo, que é muito mais integrado do que sugerem as dicotomias simples". Segundo Blakeley, "as corporações de hoje tornaram-se completamente financiarizadas com algumas a parecerem-se mais como bancos do que como empresas produtivas". Blakeley argumenta que "não estamos a testemunhar a "ascensão dos rentistas" nesta era; ao invés disso estamos a testemunhar a ascensão de todos os capitalistas – industriais e não industriais – a tornaram-se rentistas ... De facto, as corporações não financeiras estão cada vez mais empenhadas em actividades financeiras a fim de assegurar os mais altos retornos possíveis".
Se isso fosse verdade, e todo o valor proviesse de juros e renda 'extraídos' de todo mundo e não da exploração, então isto seria realmente ganhar dinheiro a partir do nada e Marx esteve a dizer asneiras. Contudo, a evidência empírica não confirma a tese da "financiarização". Sim, desde a década de 1980, os lucros do sector financeiro aumentaram como uma parcela dos lucros totais em muitas economias, embora principalmente nos EUA. Mas mesmo no auge (2006), a participação dos lucros do sector financeiro nos lucros totais atingiu apenas 40% nos EUA. Após a Grande Recessão, a participação recuou drasticamente e agora está em média em cerca de 25%. E grande parte destes lucros acabaram por ser "fictícios", como Marx os chamou, baseados em ganhos da compra e venda de acções e títulos (não nos lucros da produção), os quais desapareceram na baixa.
Além disso, a narrativa de que os sectores produtivos da economia capitalista se transformaram em rentistas ou banqueiros simplesmente não é confirmada pelos factos. Joel Rabinovich, da Universidade de Paris, efectuou uma análise meticulosa do argumento de que agora as empresas não financeiras obtêm a maior parte de seus lucros com a "extracção" de juros, rendas ou ganhos de capital e não com a exploração da força de trabalho que empregam. Ele descobriu que: "contrariamente à hipótese da rentização financeira, o rendimento financeiro calcula a média (justa) de 2,5% do rendimento total desde os anos 80, enquanto o lucro financeiro líquido fica mais negativo como percentagem do lucro total para corporações não financeiras. Em termos de activos, alguns dos alegados activos financeiros realmente reflectem outras actividades nas quais as corporações não financeiras se têm empenhado cada vez mais: internacionalização da produção, reorientação das actividades e fusões e aquisições".
Por outras palavras, corporações não financeiras como a General Motors, Caterpillar, Amazon, Google, Microsoft, grande indústria tabaco, grande farmacêutica e assim por diante ainda lucram com a venda de mercadorias da maneira habitual. Os lucros da 'financiarização' são pequenos como uma parcela do rendimento total. Estas companhias não são 'financiarizadas'.
Blakely diz que "a financiarização é um processo que começou nos anos 80 com a remoção de barreiras à mobilidade do capital". Pode ser assim, mas por que começou na década de 1980 e não antes ou depois? Por que então começou a desregulamentação do sector financeiro? Por que o 'neoliberalismo' surgiu então? Não há resposta de Blakeley, ou dos pós-keynesianos. Blakeley destaca que o "modelo social-democrata" do pós-guerra fracassou, mas ela não fornece nenhuma explicação para isso – excepto sugerir que o capitalismo não podia mais "permitir-se continuar a tolerar a exigência sindical por aumentos salariais no contexto da competição internacional crescente e alta inflação" (p.48). Blakeley sugere uma resposta: "a competição externa começou a corroer os lucros" (p.51). Mas isso levanta a questão de por que a concorrência internacional agora causou um problema quando ele não existia antes e por que havia inflação alta.
Mas a teoria económica marxista pode dar uma resposta. Foi o colapso da lucratividade do capital em todas as principais economias capitalistas. Isto está bem documentado pelos marxistas e por estudos convencionais. Este blog tem uma série de posts sobre o assunto e eu forneci uma análise clara no meu livro, The Long Depression (não é um best-seller). A queda na lucratividade forçou o capitalismo a procurar forças em sentido contrário: o enfraquecimento do movimento trabalhista por meio de baixas (slumps) e medidas anti-trabalho; privatizações, etc e também uma comutação para o investimento em activos financeiros (a que Marx chamou de 'capital fictício') para promover os lucros financeiros. Tudo isto teve como objectivo reverter a queda na lucratividade geral do capital. Teve êxito até certo ponto.
Mas Blakeley descarta esta explicação. Não era por causa da lucratividade do capital que crises ocorriam regularmente sob o capitalismo e a lucratividade nada teve a ver com a Grande Recessão [considera ela]. Ao invés disso, Blakeley segue servilmente a explicação de analistas pós-keynesianos como Hyman Minsky e Michel Kalecki. Agora, eu e outros temos gasto muita tinta a argumentar que a sua análise está incorrecta , pois deixa de fora o principal factor da acumulação capitalista, o lucro e a lucratividade. Em consequência, eles não podem realmente explicar crises.
Kalecki diz que as crises são causadas pela falta de "procura efectiva", no estilo keynesiano e, embora os governos possam superar essa falta de procura através de intervenções orçamentais e outras, elas são bloqueadas pela resistência política dos capitalistas. Como se vê, como diz Blakeley, "o argumento de Kalecki não é que a social-democracia seja economicamente instável, mas sim que é politicamente instável". Para Kalecki, as crises são causadas pelos capitalistas que politicamente não estão dispostos a concordar com reformas. Então, aparentemente, a social-democracia funcionaria sob o capitalismo se não fosse a estupidez dos capitalistas!
Minsky estava certo de que o sector financeiro é inerentemente instável e o crescimento maciço da dívida nos últimos 40 anos aumenta esta vulnerabilidade – Marx afirmou isso há 150 anos em O Capital. E no meu blog, já afirmei em muitos posts que "a dívida tem importância" . Mas crashes financeiros por si sós nem sempre levam a quedas na produção e no investimento. Na verdade, não têm sido as crises financeiras (bancarrotas bancárias, colapsos do mercado de acções, colapso dos preços das habitações, etc.) que têm levado a uma queda na produção e no investimento capitalista, a menos que haja também uma crise na lucratividade do sector produtivo da economia capitalista. Esta última ainda é decisiva.
Num capítulo do livro, World in Crisis , editado por G. Carchedi e eu (infelizmente novamente não é um best-seller), Carchedi proporciona um apoio empírico convincente para o vínculo entre os sectores financeiro e produtivo nas crises capitalistas. Carchedi: "Confrontado com a queda da lucratividade na esfera produtiva, o capital passa da baixa rentabilidade nos sectores produtivos para a alta rentabilidade nos sectores financeiros (ou seja, improdutivos). Mas os lucros nestes sectores são fictícios; eles existem apenas nos livros da contabilidade. Eles se tornam lucros reais apenas quando recebidos. Quando isto acontece, os lucros disponíveis para os sectores produtivos contraem-se. Quanto mais capitais tentam obter taxas de lucro mais altas movendo-se para os sectores improdutivos, maiores serão as dificuldades nos sectores produtivos. Esta contra-tendência – movimento de capital para os sectores financeiro e especulativo e, portanto, taxas de lucro mais altas nestes sectores – não pode conter a tendência, isto é, a queda da taxa de lucro nos sectores produtivos".
Carchedi descobre que: "Crises financeiras devem-se à impossibilidade de reembolsar dívidas e surgem quando o crescimento percentual está em queda tanto para lucros financeiros quanto para lucros reais". Na verdade, em 2000 e 2008, os lucros financeiros caíram mais do que os lucros reais pela primeira vez. Carchedi conclui que: "A deterioração do sector produtivo nos anos anteriores à crise é, portanto, a causa comum das crises financeiras e não financeiras. Se eles têm uma causa comum, é irrelevante se um precede o outro ou vice-versa. O ponto é que o (a deterioração do) sector produtivo determina as (crises no) sector financeiro ".
Pode-se perguntar: importa se as desigualdades e crises que experimentamos no capitalismo são causadas pela financiarização ou pelas leis de valor e lucratividade de Marx? Afinal de contas, todos podemos concordar que a resposta é acabar com o sistema capitalista, não? Bem, penso que isso importa, porque a acção política decorre de qualquer teoria das causas. Se aceitarmos a financiarização como a causa de todos os nossos males, isso significa que apenas as finanças são inimigas do trabalho e dos trabalhadores e não os bons capitalistas produtivos como a Amazon que apenas nos exploram no trabalho? Não deveria, mas acontece. Tome-se o próprio Minsky como exemplo . Minsky começou como um socialista, mas a sua própria teoria da financiarização nos anos 80 levou-o não a expor as falhas do capitalismo, mas sim a explicar como um capitalismo instável poderia ser "estabilizado".
Sem dúvida Blakeley é feita de material mais duro. Blakeley diz que devemos enfrentar os banqueiros com o mesmo grau de implacabilidade que Thatcher e Reagan enfrentaram o movimento trabalhista no período neoliberal principiado na década de 1980. Blakeley diz que " o manifesto do Partido Trabalhista lê-se como um retorno ao consenso do pós-guerra ... não podemos nos permitir sermos tão defensivos hoje. Devemos combater por algo mais radical… porque o modelo capitalista está a aproximar-se do fim da estrada. Se não conseguirmos substituí-lo, não há como descrever a destruição que o seu colapso pode trazer". (p.229). Isso soa como o rugido de uma leoa socialista. Mas quando se trata das políticas reais a tratar com a finança, Blakeley torna-se uma rata da social-democracia.
Primeiro, Blakeley diz que " devemos adoptar uma agenda política que desafie a hegemonia do capital financeiro, revogando seus privilégios e colocando os poderes do investimento novamente sob controle democrático". Agora, tenho argumentado em muitos postos e em reuniões do movimento trabalhista na Grã-Bretanha que a única maneira de assumir o controle democrático é trazer à propriedade pública os cinco grandes bancos que controlam 90% dos empréstimos e depósitos na Grã-Bretanha. A regulamentação desses bancos não funcionou e não funcionará .
No entanto, Blakeley ignora esta opção e, ao invés, pede medidas de "constrangimento" aos bancos existentes, ao mesmo tempo que estabelece um banco público de retalho ou bancos postais em competição juntamente com um Banco Nacional de Investimento. "O financiamento privado deve ser adequadamente constrangido" (mas o seu comando não deve ser tomado), "usando ferramentas reguladoras adoptadas internacionalmente". p.285. Em vários lugares, Blakeley refere-se a Lenine. Talvez Blakeley devesse recordar-se do que Lenine disse sobre lidar com os bancos. "Os bancos, como sabemos, são centros da vida moderna económica, os principais centros nervosos de todo o sistema económico capitalista. Falar sobre "regular a vida económica" e, no entanto, fugir da questão da nacionalização dos bancos significa trair a mais profunda ignorância ou enganar as "pessoas comuns" com palavras floridas e promessas grandiloquentes com a intenção deliberada de não cumprir tais promessas".
Quanto a um Banco Nacional de Investimento, uma promessa do Partido Trabalhista, ele deixa a maioria das decisões e recursos de investimento nas mãos do sector financeiro capitalista. Como mostrei antes, o BNI acrescentaria apenas 1-2% de PIB em investimento extra na economia britânica, a comparar com 15-20% no investimento controlado pelo sector capitalista . Portanto, a 'financiarização' não seria contida.
A outra proposta-chave de Blakeley é um Administrador de Activos do Povo (People's Asset Manager, PAM), que gradualmente compraria acções das grandes multinacionais, "socializando assim a propriedade em toda a economia" e "pressionando as empresas" a apoiar investimentos em projectos socialmente úteis. "À medida que um sistema bancário público surja e cresça ao lado de um administrador de activos do povo, a propriedade será constantemente transferida do sector privado para o sector público" (p.268) "numa tentativa de dissolver a distinção entre capital e trabalho" (p.267). Portanto, o objectivo de Blakeley não é acabar com o modo de produção capitalista, pela tomada de comando dos principais sectores de investimento e produção capitalista, mas dissolver gradualmente a "distinção" entre capital e trabalho.
Isto é o máximo em gradualismo utópico. Os capitalistas permaneceriam impávidos enquanto os seus poderes de controle fossem gradualmente ou constantemente perdidos? Uma greve de investimentos se seguiria e qualquer governo socialista seria confrontado com a tarefa de assumir o controle completo. Então, por que não formular completamente um programa para uma economia de propriedade pública controlada democraticamente com um plano nacional de investimento, produção e emprego?
O objectivo de Stolen é apresentar uma análise radical das crises e contradições do capitalismo moderno e das políticas que poderiam acabar com a "financiarização" e dar aos muitos o controle sobre seu futuro económico. Mas, como a análise é defeituosa, as políticas também são inadequadas.
Resenha do livro Stolen, de Grace Blakeley
Toda a nossa riqueza foi roubada pela grande finança e, ao fazê-lo, a grande finança pôs a nossa economia de joelhos. Portanto, devemos nos livrar da grande finança. Esta é a mensagem abreviada de um novo livro, Stolen – how to save the world from financialisation (Stolen – como salvar o mundo da financiarização), de Grace Blakeley.
Grace Blakeley é uma estrela em ascensão no firmamento da esquerda radical do movimento trabalhista britânico. Ela licenciou-se em política, filosofia e economia (PPE) na Universidade de Oxford e fez um mestrado em estudos africanos. A seguir Blakeley foi investigadora do Institute of Public Policy Research (IIPPE), um "think tank" de esquerda, e agora tornou-se o correspondente económico da revista de esquerda New Statesman. Blakeley é uma comentarista habitual e apoiante de ideias de esquerda em vários media da Grã-Bretanha. Seu perfil e popularidade elevaram seu livro, publicado esta semana, ao top 50 de todos os livros da Amazon.
Roubado: como salvar o mundo da financiarização é um relato ambicioso das contradições e fracassos do capitalismo do pós-guerra ou, mais exactamente, do capitalismo anglo-americano (porque o capitalismo europeu ou asiático é pouco mencionado e a periferia da economia mundial é coberta apenas de passagem). O livro pretende explicar como e porque o capitalismo se transformou na ladroagem do modelo da "financiarização", beneficiando poucos, enquanto destruindo (roubando?) o crescimento, o emprego e o rendimento de muitos.
Stolen conduz o leitor através dos vários períodos do desenvolvimento capitalista anglo-americano de 1945 até a Grande Recessão de 2008-9 e além. E termina com algumas propostas de política para acabar a roubalheira com um novo modelo económico (pós-financiarização) que beneficiará os trabalhadores. Isto é algo atraente. Mas o relato de Blakeley acerca da natureza do capitalismo anglo-americano moderno e das causas das crises recorrentes na produção capitalista estará correcto?
Comecemos pelo título do livro de Blakeley: "Roubado". É um título atraente para um livro. Mas ele implica que os proprietários do capital, especificamente o capital financeiro, são ladrões. Eles têm "roubado" a riqueza produzida por outros; ou eles "extraíram" a riqueza daqueles que a criaram. Isto é lucro sem exploração. Na verdade, o lucro agora vem simplesmente do roubo dos outros.
Marx chamou a isto de "lucro de alienação". Para Marx, ele é alcançado pela transferência da riqueza existente (valor) criada no processo de acumulação e produção capitalista. Mas o valor não é criado por este roubo financeiro. Para Marx, os lucros, ou valor excedente (surplus value), como os chamava Marx, são criados apenas através da exploração do trabalho na produção de mercadorias (coisas e serviços). A riqueza dos trabalhadores não é "roubada", nem a riqueza que eles criam. Sob o capitalismo, os trabalhadores recebem um salário dos empregadores pelas horas em que trabalham, conforme negociado. Mas eles produzem mais valor no tempo trabalhado do que o valor (medido em tempo de trabalho) que recebem em salários. Assim, os capitalistas obtêm uma mais-valia com a venda das mercadorias produzidas pelos trabalhadores de que eles se apropriam como donos do capital. Isto não é roubo, mas exploração. (Ver meu livro, Marx 200 , para uma explicação mais completa).
Importa se é roubo ou exploração? Bem, Marx pensava que sim. Ele argumentou ferozmente contra a ideia de Pierre-Joseph Proudhon, o socialista mais popular daquele tempo de que "a propriedade é um roubo". Dizer isso, argumentou Marx, era deixar de ver a maneira real pela qual a riqueza criada por muitos e como ela acaba nas mãos de poucos. Portanto, não estava em causa acabar com o roubo, mas sim com o capitalismo.
Em Stolen, Blakeley ignora a mais importante descoberta científica (como Engels afirmou), ou seja, a mais-valia. Ao invés disso, Blakeley engole completamente os pontos de vista dos modernos Proudhonianos como Costas Lapavitsas, David Harvey e outros como Bryan e Rafferty, os quais rejeitam a visão de Marx de que o lucro vem da exploração do trabalho. Para eles, isso é velho. Agora, o capitalismo moderno é o "capitalismo financiarizado", que obtém a sua riqueza roubando ou extraindo "rendas" de todos, não da exploração do trabalho. Isto leva Blakeley ao ponto de aceitar a falsa análise de Thomas Piketty de que os retornos ao capital aumentarão inexoravelmente através deste processo – quando a evidência é de que os retornos ao capital têm estado a cair inexoravelmente – ver aqui minha crítica a Piketty .
Mas estes argumentos "modernos" são tão falsos quanto os de Proudhon. Lapavitsas foi bem criticado pelo marxista britânico Tony Norfield ; eu envolvi David Harvey no debate sobre a teoria do valor de Marx e Bryan e Rafferty foram considerados falhos pelo marxista grego Stavros Mavroudeas . Depois de ler estas críticas, pode-se perguntar se a lei do valor de Marx pode ser ignorada ao explicar as contradições do capitalismo moderno.
Depois, há o subtítulo do livro de Blakeley: "Como salvar o mundo da financiarização". "Financiarização" como categoria ou termo tornou-se extremamente popular na teoria económica heterodoxa. A categoria veio originalmente da economia convencional, foi adoptada por alguns marxistas e promovida por economistas pós-keynesianos. Seu objectivo era explicar as contradições dentro do capitalismo e suas crises recorrentes com uma teoria que não envolvesse a lei do valor de Marx e a lei da lucratividade – ambas as quais os pós-keynesianos rejeitam ou ignoram ( ver minha carta à Monthly Review ).
Blakeley toma a definição do termo de Epstein, Krippner e Stockhammer e faz dela a peça central da narrativa do livro (p.11). Como esbocei num post anterior , se o termo significa simplesmente um aumento do papel do sector financeiro e um aumento da sua participação nos lucros nos últimos 40 anos, isso é obviamente verdade – pelo menos nos EUA e no Reino Unido. Mas se significa "a emergência de um novo modelo económico ... e uma profunda mudança estrutural no modo como a economia (capitalista) funciona" (Krippner), então trata-se de um jogo totalmente novo.
Como Stavros Mavroudeas coloca em seu excelente e novo artigo ( 393982858-QMUL-2018-Financialisation-London ), a "hipótese da financiarização" considera que "o capital monetário se torna totalmente independente do capital produtivo (pois pode explorar directamente o trabalho através da usura) e remodela as outras fracções do capital de acordo com suas prerrogativas". E se os "lucros financeiros não são uma subdivisão da mais-valia, então ... a teoria da mais-valia é, pelo menos, marginalizada. Consequentemente, a lucratividade (as principais diferenças específicas da análise económica marxista em relação à economia neoclássica e keynesiana) perde sua centralidade e o juro é autonomizado a partir dele (ou seja, do lucro – MR)".
E é claramente assim que Blakeley o encara. Aceitar este novo modelo implica que o capital financeiro é o inimigo e não o capitalismo como um todo, ou seja, excluindo os sectores produtivos (criadores de valor). Blakeley nega esta interpretação no livro. As finanças não são uma camada separada de capital sentada no topo do sector produtivo. Isso porque todo o capitalismo está agora 'financiarizado!': "qualquer análise que veja a financiarização como uma "perversão" de uma forma mais pura e produtiva de capitalismo falha na apreensão do contexto real. O que emergiu na economia global nas últimas décadas é um novo modelo de capitalismo, que é muito mais integrado do que sugerem as dicotomias simples". Segundo Blakeley, "as corporações de hoje tornaram-se completamente financiarizadas com algumas a parecerem-se mais como bancos do que como empresas produtivas". Blakeley argumenta que "não estamos a testemunhar a "ascensão dos rentistas" nesta era; ao invés disso estamos a testemunhar a ascensão de todos os capitalistas – industriais e não industriais – a tornaram-se rentistas ... De facto, as corporações não financeiras estão cada vez mais empenhadas em actividades financeiras a fim de assegurar os mais altos retornos possíveis".
Se isso fosse verdade, e todo o valor proviesse de juros e renda 'extraídos' de todo mundo e não da exploração, então isto seria realmente ganhar dinheiro a partir do nada e Marx esteve a dizer asneiras. Contudo, a evidência empírica não confirma a tese da "financiarização". Sim, desde a década de 1980, os lucros do sector financeiro aumentaram como uma parcela dos lucros totais em muitas economias, embora principalmente nos EUA. Mas mesmo no auge (2006), a participação dos lucros do sector financeiro nos lucros totais atingiu apenas 40% nos EUA. Após a Grande Recessão, a participação recuou drasticamente e agora está em média em cerca de 25%. E grande parte destes lucros acabaram por ser "fictícios", como Marx os chamou, baseados em ganhos da compra e venda de acções e títulos (não nos lucros da produção), os quais desapareceram na baixa.
Além disso, a narrativa de que os sectores produtivos da economia capitalista se transformaram em rentistas ou banqueiros simplesmente não é confirmada pelos factos. Joel Rabinovich, da Universidade de Paris, efectuou uma análise meticulosa do argumento de que agora as empresas não financeiras obtêm a maior parte de seus lucros com a "extracção" de juros, rendas ou ganhos de capital e não com a exploração da força de trabalho que empregam. Ele descobriu que: "contrariamente à hipótese da rentização financeira, o rendimento financeiro calcula a média (justa) de 2,5% do rendimento total desde os anos 80, enquanto o lucro financeiro líquido fica mais negativo como percentagem do lucro total para corporações não financeiras. Em termos de activos, alguns dos alegados activos financeiros realmente reflectem outras actividades nas quais as corporações não financeiras se têm empenhado cada vez mais: internacionalização da produção, reorientação das actividades e fusões e aquisições".
Por outras palavras, corporações não financeiras como a General Motors, Caterpillar, Amazon, Google, Microsoft, grande indústria tabaco, grande farmacêutica e assim por diante ainda lucram com a venda de mercadorias da maneira habitual. Os lucros da 'financiarização' são pequenos como uma parcela do rendimento total. Estas companhias não são 'financiarizadas'.
Blakely diz que "a financiarização é um processo que começou nos anos 80 com a remoção de barreiras à mobilidade do capital". Pode ser assim, mas por que começou na década de 1980 e não antes ou depois? Por que então começou a desregulamentação do sector financeiro? Por que o 'neoliberalismo' surgiu então? Não há resposta de Blakeley, ou dos pós-keynesianos. Blakeley destaca que o "modelo social-democrata" do pós-guerra fracassou, mas ela não fornece nenhuma explicação para isso – excepto sugerir que o capitalismo não podia mais "permitir-se continuar a tolerar a exigência sindical por aumentos salariais no contexto da competição internacional crescente e alta inflação" (p.48). Blakeley sugere uma resposta: "a competição externa começou a corroer os lucros" (p.51). Mas isso levanta a questão de por que a concorrência internacional agora causou um problema quando ele não existia antes e por que havia inflação alta.
Mas a teoria económica marxista pode dar uma resposta. Foi o colapso da lucratividade do capital em todas as principais economias capitalistas. Isto está bem documentado pelos marxistas e por estudos convencionais. Este blog tem uma série de posts sobre o assunto e eu forneci uma análise clara no meu livro, The Long Depression (não é um best-seller). A queda na lucratividade forçou o capitalismo a procurar forças em sentido contrário: o enfraquecimento do movimento trabalhista por meio de baixas (slumps) e medidas anti-trabalho; privatizações, etc e também uma comutação para o investimento em activos financeiros (a que Marx chamou de 'capital fictício') para promover os lucros financeiros. Tudo isto teve como objectivo reverter a queda na lucratividade geral do capital. Teve êxito até certo ponto.
Mas Blakeley descarta esta explicação. Não era por causa da lucratividade do capital que crises ocorriam regularmente sob o capitalismo e a lucratividade nada teve a ver com a Grande Recessão [considera ela]. Ao invés disso, Blakeley segue servilmente a explicação de analistas pós-keynesianos como Hyman Minsky e Michel Kalecki. Agora, eu e outros temos gasto muita tinta a argumentar que a sua análise está incorrecta , pois deixa de fora o principal factor da acumulação capitalista, o lucro e a lucratividade. Em consequência, eles não podem realmente explicar crises.
Kalecki diz que as crises são causadas pela falta de "procura efectiva", no estilo keynesiano e, embora os governos possam superar essa falta de procura através de intervenções orçamentais e outras, elas são bloqueadas pela resistência política dos capitalistas. Como se vê, como diz Blakeley, "o argumento de Kalecki não é que a social-democracia seja economicamente instável, mas sim que é politicamente instável". Para Kalecki, as crises são causadas pelos capitalistas que politicamente não estão dispostos a concordar com reformas. Então, aparentemente, a social-democracia funcionaria sob o capitalismo se não fosse a estupidez dos capitalistas!
Minsky estava certo de que o sector financeiro é inerentemente instável e o crescimento maciço da dívida nos últimos 40 anos aumenta esta vulnerabilidade – Marx afirmou isso há 150 anos em O Capital. E no meu blog, já afirmei em muitos posts que "a dívida tem importância" . Mas crashes financeiros por si sós nem sempre levam a quedas na produção e no investimento. Na verdade, não têm sido as crises financeiras (bancarrotas bancárias, colapsos do mercado de acções, colapso dos preços das habitações, etc.) que têm levado a uma queda na produção e no investimento capitalista, a menos que haja também uma crise na lucratividade do sector produtivo da economia capitalista. Esta última ainda é decisiva.
Num capítulo do livro, World in Crisis , editado por G. Carchedi e eu (infelizmente novamente não é um best-seller), Carchedi proporciona um apoio empírico convincente para o vínculo entre os sectores financeiro e produtivo nas crises capitalistas. Carchedi: "Confrontado com a queda da lucratividade na esfera produtiva, o capital passa da baixa rentabilidade nos sectores produtivos para a alta rentabilidade nos sectores financeiros (ou seja, improdutivos). Mas os lucros nestes sectores são fictícios; eles existem apenas nos livros da contabilidade. Eles se tornam lucros reais apenas quando recebidos. Quando isto acontece, os lucros disponíveis para os sectores produtivos contraem-se. Quanto mais capitais tentam obter taxas de lucro mais altas movendo-se para os sectores improdutivos, maiores serão as dificuldades nos sectores produtivos. Esta contra-tendência – movimento de capital para os sectores financeiro e especulativo e, portanto, taxas de lucro mais altas nestes sectores – não pode conter a tendência, isto é, a queda da taxa de lucro nos sectores produtivos".
Carchedi descobre que: "Crises financeiras devem-se à impossibilidade de reembolsar dívidas e surgem quando o crescimento percentual está em queda tanto para lucros financeiros quanto para lucros reais". Na verdade, em 2000 e 2008, os lucros financeiros caíram mais do que os lucros reais pela primeira vez. Carchedi conclui que: "A deterioração do sector produtivo nos anos anteriores à crise é, portanto, a causa comum das crises financeiras e não financeiras. Se eles têm uma causa comum, é irrelevante se um precede o outro ou vice-versa. O ponto é que o (a deterioração do) sector produtivo determina as (crises no) sector financeiro ".
Pode-se perguntar: importa se as desigualdades e crises que experimentamos no capitalismo são causadas pela financiarização ou pelas leis de valor e lucratividade de Marx? Afinal de contas, todos podemos concordar que a resposta é acabar com o sistema capitalista, não? Bem, penso que isso importa, porque a acção política decorre de qualquer teoria das causas. Se aceitarmos a financiarização como a causa de todos os nossos males, isso significa que apenas as finanças são inimigas do trabalho e dos trabalhadores e não os bons capitalistas produtivos como a Amazon que apenas nos exploram no trabalho? Não deveria, mas acontece. Tome-se o próprio Minsky como exemplo . Minsky começou como um socialista, mas a sua própria teoria da financiarização nos anos 80 levou-o não a expor as falhas do capitalismo, mas sim a explicar como um capitalismo instável poderia ser "estabilizado".
Sem dúvida Blakeley é feita de material mais duro. Blakeley diz que devemos enfrentar os banqueiros com o mesmo grau de implacabilidade que Thatcher e Reagan enfrentaram o movimento trabalhista no período neoliberal principiado na década de 1980. Blakeley diz que " o manifesto do Partido Trabalhista lê-se como um retorno ao consenso do pós-guerra ... não podemos nos permitir sermos tão defensivos hoje. Devemos combater por algo mais radical… porque o modelo capitalista está a aproximar-se do fim da estrada. Se não conseguirmos substituí-lo, não há como descrever a destruição que o seu colapso pode trazer". (p.229). Isso soa como o rugido de uma leoa socialista. Mas quando se trata das políticas reais a tratar com a finança, Blakeley torna-se uma rata da social-democracia.
Primeiro, Blakeley diz que " devemos adoptar uma agenda política que desafie a hegemonia do capital financeiro, revogando seus privilégios e colocando os poderes do investimento novamente sob controle democrático". Agora, tenho argumentado em muitos postos e em reuniões do movimento trabalhista na Grã-Bretanha que a única maneira de assumir o controle democrático é trazer à propriedade pública os cinco grandes bancos que controlam 90% dos empréstimos e depósitos na Grã-Bretanha. A regulamentação desses bancos não funcionou e não funcionará .
No entanto, Blakeley ignora esta opção e, ao invés, pede medidas de "constrangimento" aos bancos existentes, ao mesmo tempo que estabelece um banco público de retalho ou bancos postais em competição juntamente com um Banco Nacional de Investimento. "O financiamento privado deve ser adequadamente constrangido" (mas o seu comando não deve ser tomado), "usando ferramentas reguladoras adoptadas internacionalmente". p.285. Em vários lugares, Blakeley refere-se a Lenine. Talvez Blakeley devesse recordar-se do que Lenine disse sobre lidar com os bancos. "Os bancos, como sabemos, são centros da vida moderna económica, os principais centros nervosos de todo o sistema económico capitalista. Falar sobre "regular a vida económica" e, no entanto, fugir da questão da nacionalização dos bancos significa trair a mais profunda ignorância ou enganar as "pessoas comuns" com palavras floridas e promessas grandiloquentes com a intenção deliberada de não cumprir tais promessas".
Quanto a um Banco Nacional de Investimento, uma promessa do Partido Trabalhista, ele deixa a maioria das decisões e recursos de investimento nas mãos do sector financeiro capitalista. Como mostrei antes, o BNI acrescentaria apenas 1-2% de PIB em investimento extra na economia britânica, a comparar com 15-20% no investimento controlado pelo sector capitalista . Portanto, a 'financiarização' não seria contida.
A outra proposta-chave de Blakeley é um Administrador de Activos do Povo (People's Asset Manager, PAM), que gradualmente compraria acções das grandes multinacionais, "socializando assim a propriedade em toda a economia" e "pressionando as empresas" a apoiar investimentos em projectos socialmente úteis. "À medida que um sistema bancário público surja e cresça ao lado de um administrador de activos do povo, a propriedade será constantemente transferida do sector privado para o sector público" (p.268) "numa tentativa de dissolver a distinção entre capital e trabalho" (p.267). Portanto, o objectivo de Blakeley não é acabar com o modo de produção capitalista, pela tomada de comando dos principais sectores de investimento e produção capitalista, mas dissolver gradualmente a "distinção" entre capital e trabalho.
Isto é o máximo em gradualismo utópico. Os capitalistas permaneceriam impávidos enquanto os seus poderes de controle fossem gradualmente ou constantemente perdidos? Uma greve de investimentos se seguiria e qualquer governo socialista seria confrontado com a tarefa de assumir o controle completo. Então, por que não formular completamente um programa para uma economia de propriedade pública controlada democraticamente com um plano nacional de investimento, produção e emprego?
O objectivo de Stolen é apresentar uma análise radical das crises e contradições do capitalismo moderno e das políticas que poderiam acabar com a "financiarização" e dar aos muitos o controle sobre seu futuro económico. Mas, como a análise é defeituosa, as políticas também são inadequadas.