De que falamos quando falamos de soberania alimentar?

De que falamos quando falamos de soberania alimentar?
Quando se nos quer falar de soberania alimentar simplesmente se estão a reproduzir uns quantos conceitos “altermundistas”, ficando a questão nacional totalmente marginalizada

A que seica vai ser a candidata número cinco na candidatura de Izquierda Unida (IU) para as próximas eleições ao Parlamento Europeu escrevia o outro dia um artigo a respeito da soberania alimentar e perguntava-se, não sem certa retórica, de que é do que estamos a falar quando se fala de soberania alimentar.                

Em setembro de 2001 o Foro Mundial sobre a Soberania Alimentar, celebrado n´A Habana, definiu esta como “o direito dos povos a determinar as suas próprias políticas e estratégias sustentáveis de produção, distribuição e consumo de alimentos que garantam o direito à alimentação de toda a sua povoação, com base na pequena e média produção”.

Tomando como base esta definição, cabe perguntar-se; quem é o sujeito político, povo que determina (debate catalão), com capacidade para decidir a política a seguir com o fim de garantir o direito a uma alimentação saudável e de qualidade para toda a povoação? .Esclarecer esta ponto, acho eu, é questão fulcral para definir claramente do que estamos a falar quando falamos de soberania alimentar.            

De botarmos uma fugaz olhada a nossa história podemos comprovar que as decisões sobre o nosso destino sempre foram adotadas, e seguem-no a ser, por agentes políticos externos a Galiza. Assim a evolução do nosso rural e por extensão da agricultura galega vem sendo condicionada pela tomada de decisões adotadas em centros de poder alheios a Galiza, podendo-se distinguir claramente dois períodos; um que vai até a entrada do Estado espanhol na CEE, e outro a partir desse momento.                      

O primeiro período abarca a maior parte da história da Galiza e inicia-se no momento em que começou a se esvaecer a nossa identidade ou singularidade como povo diferenciado. Nesta fase histórica o instrumento empregado para condicionar o nosso devir foram os distintos governos da Espanha.                        

A segunda etapa inicia-se quando o Estado espanhol entra na CEE, ficando o destino dos nossos setores produtivos subordinado aos ditados emanados do instrumento de decisão do capitalismo europeu, situado em Bruxelas. Assim a nossa agricultura ficou totalmente condicionada pela Política Agrária Comum (PAC).                          

Por causa das políticas impostas desde fora e com a aquiescência da maior parte dos chamados governos galegos, a excepção do período no que o nacionalismo teve  responsabilidades de governo, levamos anos assistindo a um processo perfeitamente planificado e desenhado de destruição do rural galego que se manifesta na grande crise demográfica, no dramático fenômeno de paro e na expulsão da nossa juventude, tendo estes fenômenos a sua máxima expressão na alarmante desertificação da maior parte do nosso território com a conseguinte desestruturação do Pais.

Vemos, pois, que praticamente em nenhuma etapa da nossa história o povo galego, como sujeito político com capacidade de decisão, teve a oportunidade de exercer o direito inalienável de poder reger o seu destino. Isto é, de fazer uso da sua soberania. Em coerência quando falamos em soberania nacional também estamos a falar de soberania alimentar.

O poder dispor soberania é garantia indispensável para poder contar com uma política agrária galega. Política agrária própria que tem de ter como objectivo fulcral pôr os alicerces para acometer o desenvolvimento das nossas potencialidades produtivas e a revitalização do rural galego, todo o contrário do que viu acontecendo até agora.                  

Soberania alimentar que não pode ser interpretada, em nenhum caso, como sinônimo de autarquia, mas sim como capacidade para poder dar resposta às demandas dos nossos setores produtivos, satisfazer as nossas necessidades alimentares, assim como para poder estabelecer relações comerciais em pé de igualdade, com o fim de poder canalizar as nossas produções excedentárias, como o leite, o vinho ou a carne, por pôr três exemplos bem significativos, assim como para poder fornecermo-nos dos produtos dos que somos deficitários ou mesmamente não possuímos.

Resulta, quando menos, chamativo que em todo o texto elaborado por uma pessoa que se define assim mesmo como nacionalista, não apareça nenhuma referência à necessidade de a Galiza dispor de capacidade de decisão para poder chegar a ter a tão desejada soberania alimentar, e perante desta ausência saltam-me duas perguntas: como se pretende conseguir a instalação de labregos e labregas no rural galego? e, com que instrumentos?                   

Da leitura deste artigo pode-se concluir que quando se nos quer falar de soberania alimentar simplesmente se estão a reproduzir uns quantos conceitos “altermundistas”, ficando a questão nacional totalmente marginalizada.                        

Esta carência pode ser explicada em função da deriva ideológica da autora, iniciada já há bastantes anos, a que a leve a pensar que o nacionalismo é um assunto secundário e que o principal, nestes momentos, passa por resolver os conflitos sociais independentemente do lugar do mundo onde se dêem, o que por outra parte está a pôr de manifesto uma grave contradição entre o que se diz ser (nacionalista) e o que na realidade se pratica, ir nas listas de uma organização espanholista como IU.