A voltas de novo com o leite e as reviravoltas do neoliberalismo

A voltas de novo com o leite e as reviravoltas do neoliberalismo
Tanto a crise do capitalismo como a sua variante no sector leiteiro é que o livre mercado não serve como instrumento regulador

Nestes últimos tempos distintos colaboradores do "Terra e Tempo" digital têm escrito sobre este mesmo assunto, mas a verdade é que o tema a cada pouco apresenta novidades que o fam estar permanentemente de actualidade, sem esquecer a importância que este sector produtivo tem para a economia galega.

Os acontecimentos que merecem a nossa atenção têm a ver com as negociações que estão tendo lugar em Madrid no seio da Inter-profissional Leiteira Espanhola (Inlac) e com o Informe do Grupo de Alto Nível (GAN), grupo de expertos, constituido na União Europeia, encarregado de analisar e propor soluções para este sector, como consequência da crise leiteira que percorreu a UE no ano 2009, provocada pelos baixos preços pagos às explorações produtoras.

O informe do GAN estabelece sete recomendações. A primeira centra-se nas relações contratuais entre a parte produtora e a parte industrial, a segunda  está relacionada com o poder de negociação da produção perante a indústria, a terceira refire-se à possibilidade de constituir uma organização inter-profissional a nível europeio tomando como exemplo as que já funcionam no sector da fruta e hortaliça, a quarta recomendação fala da transparência (observatórios de mercado), a quinta versa sobre medidas de mercados e futuros, a sexta tem por objecto o estabelecimento de standards de marketing e rotulagem da origem dos produtos leiteiros e por último a sétima é sobre a inovação e a investigação.

Se algo estão a demonstrar tanto a crise do capitalismo como a sua variante no sector leiteiro é que o livre mercado não serve como instrumento regulador.

Mais bem teriamos de dizer que o capitalismo é em sim mesmo um sistema injusto, pelo que não há nenhum elemento que o possa regular. Mas a crise no sector leiteiro poderia ter servido para chegar à conclusão de que se as actuais relações mercantis não servem para regular o sector, algo que se intui nas próprias recomendações do GAN, torna-se precisa a intervenção dos poderes políticos.

Mas longe de fazer qualquer recomendação neste sentido o GAN o máximo que chega  a propor é o estabelecimento de relações contratuais apelando à "responsabilidade" dos operadores na cadeia láctea. O próprio documento reconhece que o sector produtor se atopa perante o sector industrial numa situação de desquilibrio, seria mais rigoroso dizer que se encontra em inferiridade, à hora de negociar. Textualmente diz " Este desequilibrio pode levar a praticas comerciais injustas, em particular quando os produtores não sabem o preço do leite aquando o entregam (o preço é fixado pelas indústiras muito após  do leite ser entregue ....)". Num outro parágrafo reconhece-se que o mercado é o causante da situação de crise que padecem as explorações leiteras, chegando-se a dizer que "O valor acrescentado está-se a concentrar cada vez mais, ao longo da cadeia de valor láctea, nos sectores intermediarios", é dizer nas maos das empresas transformadoras e das grandes áreas comerciais

Perante desta situação o que propõe o GAN é que se constituam organizações de produtores em base a titulares das explorações que possam negociar o contrato, mas chegados a este ponto o que não concreta o documento é como se teriam de constituir essas organizações, o mais que chega a dizer é que teriam de ser somente de titulares de explorações, entende-se de leite, o que pode significar que fiquem excluídas as organizações agrárias, já que nelas se integram explorações não exclusivamente de leite e não todas as pessoas integradas nas mesmas são titulares de explorações, e por outra parte também não está claro o espaço de referência da negociação, fala-se de "mercado relevante", mas fica por definir o tamanho ideal do mercado relevante, podendo ser regional, nacional, trans-nacional e mesmo a nível da UE.

Neste sistema negociador proposto pelo GAN às administrações não se lhe assinala nenhum papel. Esta crise que deveria ter servido para questionar o aparente papel regulador do livre mercado e à vista do seu fracasso propor o controlo e a intervenção dos poderes públicos num sector tam delicado como é o ramo da produção de alimentos, na prática é empregada para todo o contrário.

As reais intenções das propostas do GAN encontrámo-las expostas claramente na recomendação quinta onde se diz que se "convida à Comissão ao uso de mercados de futuros". Na exposição de motivo que antecede a esta recomdação podem-se ler argumentos como os seguintes: "Fica claro, que este instrumento não é provável que reduza a volatilidade nos preços", outro "Expressou-se preocupação pelos efeitos dos especuladores nos mercados de futuros", mais o argumento mais desavergonhado é o que fecha o argumentário, e diz "Por outro lado, os especuladores são necessários para dar liquidez, o que se faz necessário para o funcionamento do mercado de futuros". Fica claro de que vai tudo isto?

Um último comentário a respeito das negociações que se estam a levar em Madrid no seio da da Inter-profissional leitera eapanhola (Inlac). Estou muito preocupado porque o futuro do sector leiteiro galego se decida em Espanha e não na Galiza, sendo como somos a primeira potência produtora de leite de todo o Estado. O mais inquietante desta situação é que, com a conselharia nacionalista, se tinha conseguido impor um âmbito galego de negociações e agora com a política imposta pelo PP e pelo PSOE esse espaço de negociação se perdeu com o beneplácito e aplauso público e obsceno de todas organizações profissionais agrárias, sem excepção, e a organização galega de cooperativas, com o que o nosso País está a perder a posição de liderança que nos corresponde, em tanto as nossas explorações seguem a cobrar preços por baixo da meia das do Estado Espanhol e estas a sua vez cobram menos que a meia da UE. Um despropósito!!