Ofensiva militarizada com objectivos totalitários na Ucrânia

Ofensiva militarizada com objectivos totalitários na Ucrânia

Apesar de no dia 20 o Parlamento ucraniano ter aprovado um "Memorando para a paz e o consenso" em que pede a retirada imediata de tropas da parte Leste do país , a junta fascista de Kiev desencadeia neste momento uma operação militar brutal e genocida contra os ucranianos que defendem a democracia na Ucrânia.

A operação de "assalto final" é executada não só pelas forças armadas regulares, como também por efectivos da Guarda Nacional recrutados entre grupos neo-nazis, bem como por mercenários estrangeiros, com o apoio de peritos da CIA e do FBI.

Esta ofensiva militar verifica-se no mesmo momento em que o regime de Kiev – com o apoio dos EUA, da NATO e da UE – encena as suas "eleições" ilegais e ilegítimas, marcadas para o dia 25.

Os media do ocidente escondem e desinformam deliberadamente a amplitude desta nova guerra genocida que o imperialismo agora desencadeia na Europa, com a aquiescência servil dos dirigentes da UE.

Efraín Chury Iribarne: Comecemos pela Ucrânia, onde foi cometido um massacre e onde os diários alemães revelam ser muito grande a quantidade de assessores da CIA e do FBI.

JP: É preciso analisar a situação em conjunto. O governo de Kiev é o resultado de um golpe financiado pelos EUA, é um governo com uma junta civil militar mas não tem o apoio de muitos sectores da sociedade, inclusive em Kiev. Além disso, afectou sectores importantes do exército.

Assim, não há nenhum sector da sociedade que seja fiel à junta de Kiev. Por isso, para fortalecer a junta, os EUA enviaram três tipos de intervenções. Uma é a força especial que está a contratar mercenários para actuarem a favor de Kiev; a segunda é a polícia federal, o FBI norte-americano, que se está a organizar para o expurgo e as investigações em torno do governo a fim de evitar que surjam outras mobilizações contra a junta. E a terceira intervenção é a da CIA, que está a trabalhar com os fascistas e neofascistas organizando os massacres que vimos em Odessa.

Então, o que falta ao governo da junta de Kiev os EUA – principalmente – estão a dar, substituem-no com a sua própria força. É uma força intervencionista para fortalecer um regime muito frágil que perdeu o apoio que terá tido em algum momento. Assim, para seus esforços por conquistar o Leste só tem as forças especiais capazes de massacrar e matar o seu próprio povo.

Creio que a imprensa ocidental é altamente cúmplice com isto tudo. Não fala do povo ucraniano democrático anti-junta, falam dos "sectores pró russos", como se não tivessem uma identidade ucraniana, uma vez que a grande maioria são operários industriais e as suas preocupações não são com a Rússia e sim com a perda de trabalho, a perda de rendimento, a perda de estabilidade, a perda da democracia, por limitada que seja.

Mas ao invés disso, como podemos ler no Financial Times, em La Nación da Argentina e na imprensa pseudo progressista como o Página 12 argentino ou o La Jornada mexicano, todos fazem a mesma caracterização da imprensa burguesa: são os "pró russos" que estão a protestar e a violência não se pode atribuir a nenhum sector, porque ambos os lados estão envolvidos. Quando esta notícia circula, no melhor dos casos confunde as pessoas no ocidente e nos pior deles estimula a agressividade contra o povo ucraniano.

ECI: A situação violenta mantém-se então?

JF: Não é violência. É uma ofensiva centrada no genocídio contra os que falam russo na Ucrânia, que em grande parte são proletários, operários que trabalham na indústria siderúrgica, nas minas de carvão, nas empresas manufactureiras, particularmente no sector armamentista. São os de língua russa que estão a cultivar as terras negras da Ucrânia, etc.

Devemos ter claro que há uma ofensiva militarizada com metas totalitárias, que pretende fazer um grande expurgo na Ucrânia para deslocar todas as forças que estão contra o rompimento de relações com a Rússia e estão contra a subordinação à NATO e à Europa. Porque sabem que o comércio com a Rússia é muito favorável à Ucrânia, ao passo que o comércio com a Europa e os EUA vai destruir 90% das indústrias ucranianas.

Essa é a situação que devemos entender. Não é simplesmente uma situação de violência. Os conselhos Operários e Populares na Ucrânia do Leste são um embrião de democracia socialista. As Milícias Populares são o germe de um Exército de Libertação, não são simplesmente violentos, como a imprensa apresenta na propaganda ocidental. São formas autónomas de o povo actuar. Não são o produto da intervenção russa – ao contrário, a Rússia adoptado uma posição de bastante distanciamento dos acontecimentos. A Rússia simplesmente queria voltar a um governo estável, um governo neutro frente aos grandes blocos. O que a Rússia apoiava na Ucrânia antes do golpe de Estado era um governo de centro direita que mantivesse relações económicas com a Rússia e com a Europa.

Agora, com o governo dominado pela NATO, tomaram posições críticas mas a Rússia não tem nada a ver com a auto-organização, a democracia em Conselhos nem com as milícias populares. Isso não existe na Rússia mas existe sim no Leste ucraniano como forma de resistência aos neofascistas e golpistas de Kiev.

ECI: Fala-se do apoio da Polónia e dos países bálticos aos fascistas ucranianos.

JP: Bem, a Polónia é dominada por governos muito de direita. O que existe na Polónia é uma mistura de nacionalismo patológico com subordinação à NATO. A Polónia foi o país que mais apoiou a política direitista dos EUA, foi um grande apoio desde Reagan até Bush, os presidentes mais agressivos dos EUA. Os governantes têm fobia contra a Rússia, têm fobia contra o comunismo. E não me surpreenderia que os polacos estivessem a treinar os sectores mais direitistas e mais fascistas na Ucrânia, apesar de os fascistas terem massacrado os polacos na Segunda Guerra Mundial. Não importa a história, o que importa é a coincidência entre a política dos neofascistas na Ucrânia com os governantes na Polónia de hoje.

ECI: Vemos a Venezuela, onde assassinaram um guarda-costas de Maduro, o que demonstra que a direita continua actuante.

JP: Os fascistas e os golpistas na Venezuela não pararam, suas organizações mantêm-se intactas, perderam alguns líderes – algum vereador, algum dirigente, etc – mas a estrutura continua e mantêm relações clandestinas com os empresários e os sectores de direita que estão a negociar com o governo.

Creio que o sector capitalista procura extrair as maiores concessões, ou melhor, um "pacto de produção" com o governo de Maduro. Enquanto isso travam os fascistas, mas a qualquer momento marcar distâncias e inclusive poder chegar a denunciá-los. Mas ao mesmo tempo continuam a tentar libertar os fascistas encarcerados.

Portanto, mantêm um duplo discurso: procurando um pacto e condições favoráveis junto ao governo, fundamentalmente receber dólares para as importações, a especulação e o roubo; e por outro lado não descartam o recursos aos fascistas a qualquer momento.

É uma situação complexa. Devemos dizer que apesar de haver sectores capitalistas que estão a negociar seriamente com o governo de Maduro, inclusive alguns emitiram declarações favoráveis às medidas de Maduro a favor do capital; contudo não estão satisfeitos com o Presidente no plano estratégico. Querem substituí-lo por algum deles para desbaratar completamente a parte social da política actual.

Então há um jogo de cabo-de-guerra (tira y afloje) na direita, conforme os momentos e as circunstâncias. Neste momento, com a queda dos direitistas e fim das grandes mobilizações, procuram conseguir nas negociações o que não conseguiram na rua.

ECI: O presidente uruguaio José Mujica – que diz ser muito amigo de Maduro e que também o foi de Chávez – dentro de sete dias estará a visitar a Casa Branca e, segundo disse, na conversação com Barack Obama "não calará nada". O que pode surgir dessa reunião?

JP: Em primeiro lugar, é preciso saber que apesar de a imprensa e o oficialismo continuarem a tratar o governo Mujica como de "esquerda", a imagem do mesmo é muito positiva nas páginas financeiras daqui e entre os círculos mais influentes do capitalismo. Estão muito impressionados com a política de abertura aos grandes capitais e ao investimento estrangeiro, fundamentalmente na mineração e na agricultura.

Em segundo lugar, consideram que é muito favorável a estabilidade política que os governantes da Frente Ampla impuseram no Uruguai, sobretudo no ambiente para os investimentos, que entendem como muito mais favorável no Uruguai do que na Argentina, Brasil ou Paraguai. Portanto Mujica vem aqui com uma grande percepção positiva.

Agora, se ele quiser mencionar algo sobre a Venezuela, Obama vai bater-lhe no ombro, vai escutá-lo, dir-lhe-á que podem ter divergências entre as grandes convergências, etc. Mas não vão levar a sério o que Mujica disser sobre alguma mudança no que se refere à política norte-americana para com Cuba ou Venezuela.

Gastarão 95% do tempo a falar dos negócios, da colaboração do Uruguai nos assuntos militares e económicos, das convergências estratégicas e do fortalecimento desses laços capitalistas. Isto parece-me mais provável de acordo com os indícios; não é de esperar nenhuma ruptura nem pouco mais ou menos, sabendo que as críticas e divergências estão à margem das conversações "sérias".

ECI: Estes últimos minutos, como sempre, deixamos para que nos fale dos temas em que está a trabalhar e queira destacar.

JP: Bem, há dois temas. O primeiro é o massacre de Odessa. Os fascistas entraram em Odessa em autocarros e helicópteros que lhes foram dados pelo governo de Kiev. Ou seja, o assassinato de mais de 40 pessoas num incêndio em Odessa foi algo planeado, não foi simplesmente um "conflito" espontâneo. Além disso, as vítimas foram mulheres e adolescentes que procuraram refugiar-se da multidão fascista da rua. E o acto de assaltar e queimar os refugiados a sangue frio parece-me um dos piores atentados nos últimos anos em toda a Europa. É difícil imaginar um acto tão friamente calculado como esse.

Enquanto isso a imprensa no ocidente ainda tenta disfarçar este massacre como se fosse um conflito, como se tivesse sido acto de um grupo marginal ou de provocadores. Mas está muito claro que os envolvidos são os mesmos que compartilham o governo da junta de Kiev. Que o terrorismo faz parte da política de advertir àqueles que simpatizam com a independência e a autonomia da Ucrânia do Leste, que buscam uma democracia, de que vão sofrer as mesmas consequências. É um castigo exemplar dos fascistas, para aterrorizar outros sectores a saírem do país.

Finalmente, o que procuram é limpar a Ucrânia de milhares e milhares de pessoas que simpatizam com as reivindicações democráticas e linguísticas. Querem uma Ucrânia governada pela junta fascista que actua sob o controle da Europa e dos EUA, sem oposição e sem qualquer vínculo com a Rússia.

Este massacre parece-me algo semelhante ao que se passava na Rússia durante a época do czar, quando em Odessa ocorreram muitos progrons. Hoje são progrons contra os russos. O legado actual das Centúrias Negras é a direita fascista que hoje está a fazer o mesmo, mas como não há judeus estão a matar os democratas, os operários e simpatizantes da democracia.

O outro tema que quero tratar é a detenção de Gerry Adams, dirigente do Sinn Féinn irlandês, que foi preso três semanas antes das eleições. O Sinn Féinn é o Partido Republicano que quer a independência da Inglaterra e Adams está encarcerado há quatro dias [já foi libertado] sob interrogatório de mais de 7 horas por dia, acusado de estar envolvido num assassinato há 40 anos.

Isto é uma provocação eleitoral para tentar travar o crescimento dos nacionalistas republicanos frente à falta de apoio daqueles que procuram a unidade com a Inglaterra. E não há nenhum protesto no mundo anglo-saxão com esta provocação.

Gerry Adams é o líder do Sinn Féinn, é muito popular e a sua popularidade está a crescer, tem muitas possibilidades de aumentar o número de representantes no Parlamento Europeu. Por isso, as eleições no mundo burguês estão sempre sob a intervenção das forças da direita. O caso Gerry Adams é outro exemplo de que quando as forças progressistas estão a ponto de influir seriamente no processo, eles procuram pretextos para deteriorar essas opções.



Esta entrevistas atópa-se en resistir.info